São Paulo (AUN - USP) - O mundo da física está em festa. O Grande Colisor de Hádrons (LHC), o maior acelerador de partículas do mundo, voltou a funcionar em 30 de março, realizando as colisões mais energéticas já vistas em laboratório. Além de reproduzir e permitir a análise, em miniatura, de condições similares às do Big Bang – a grande explosão que originou o universo – o LHC promete trazer para a sociedade a computação em grid (ou computação em grade ou grelha), tecnologia de processamento de dados tão inovadora quanto foi a internet décadas atrás.
O LHC produz uma grande quantidade de dados, incapaz de ser processada em um computador, um laboratório ou mesmo em uma universidade. Se gravados, esses dados renderiam 100 mil DVD's por ano, ou encheriam em poucos segundos o HD de um computador comum. A solução para o processamento é juntar recursos de computação do mundo inteiro, distribuindo os dados, seu processamento e análise em unidades de colaboração espalhadas pelos sete cantos do globo, formando um verdadeiro hiper-computador.
“Eu entro no meu computador aqui em São Paulo, acesso a informação que quero analisar, e cada parte dessa informação é processada em um lugar: Estados Unidos, Japão, Europa. Depois essas partes processadas se unem e eu recebo a resposta. Essa tecnologia de fazer os computadores conversarem no mundo inteiro para analisar dados é algo bastante novo e que terá um impacto grande para a sociedade”, diz Alexandre Suaide, professor do Departamento de Física Nuclear do Instituto de Física (IF) da USP, e membro da equipe colaboradora do LHC no Brasil. A tecnologia do grid de computação, quando disponível para além dos laboratórios, poderá fazer previsões climáticas e simulações de grandes mudanças atmosféricas – previsões essas que não podem ser feitas hoje em um computador comum.
“É como uma grade enorme, com pontos desses computadores espalhados pelo mundo inteiro. Fazemos a analogia de que o grid é para o processamento de dados o que a internet é para a informação. Internet é informação espalhada pelo mundo inteiro, acessível de qualquer parte. Grid é processamento de dados espalhado e acessível pelo mundo”, explica Marcelo Munhoz, também do Departamento de Física Nuclear do IF e membro colaborador do LHC. Ele lembra que a internet foi criada dentro da Organização Europeia para a Investigação Nuclear (CERN) – onde hoje existe o LHC – simplesmente para facilitar a comunicação interna entre os físicos.
Leandro de Paula, colaborador do LHC pela equipe da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), porém, empolga-se é com o colisor. «A tecnologia pode ser importante para a sociedade, mas os físicos gostam mesmo é de ver as partículas colidirem!»
Destruir para entender
Os pesquisadores buscam o entendimento de constituintes gerais da matéria – e como melhor entender alguma coisa se não quebrando-a em pedacinhos para analisá-los? É isso que faz um acelerador de partículas, ao colidir prótons e analisar as trajetórias das partículas criadas nessas colisões. O tubo de uma televisão tradicional é um acelerador de partículas – o diferencial do LHC é que ele quer medidas mais precisas e colisões em energias muito altas, para analisar casos raros.
Podendo ser considerado a maior máquina do mundo, o acelerador tem 27Km de extensão, utiliza filamentos para condução de energia que poderiam percorrer dez vezes a distância entre a Terra e o Sol, produz o maior vácuo da Terra e ao mesmo tempo as temperaturas mais baixas e mais altas do Universo: de -270,5ºC, no seu interior, a 10¹6 ºC, ou 1 milhão de vezes a temperatura do centro do Sol, no momento da colisão. A equipe que analisa os dados conta com 10 mil pessoas, espalhadas em equipes colaboradoras em todos os continentes – são 100 brasileiros, sendo cinco professores e cerca de 30 alunos de graduação e pós-graduação da USP.
Financiamento
O custo de construção desta grande máquina foi de US$ 11 bilhões, obtidos a partir de um empréstimo bancário. Agora, a organização recebe doações de países interessados para quitar a dívida.
“Empresas em geral não querem investir – é uma 'grande besteira' na visão delas, pois os resultados práticos não virão nem para o mês nem para o ano que vem. No início do século XIX, quando começaram a pesquisar radiação, aquilo também parecia uma grande besteira, mas sem isso, hoje não teríamos o raio-X. É preciso que os governos invistam na pesquisa, porque a iniciativa privada não vai investir”, declara Suaide.