São Paulo (AUN - USP) - A relação da poluição atmosférica com o aumento de alergias e doenças respiratórias já é bem conhecida. Porém, ela também é uma das responsáveis por mudanças na taxa de fertilidade da população e contribui para o baixo peso de recém-nascidos. Isso acontece porque as partículas tóxicas presentes no ar também agem sobre os hormônios e as células reprodutivas, alterando o funcionamento de ambos. São essas as conclusões de pesquisas do Laboratório de Poluição Atmosférica da Faculdade de Medicina da USP.
A taxa de nascimentos considerada normal é de, aproximadamente, 51,5% homens e 48,5% mulheres. Os estudos realizados mostraram que, nas grandes cidades, houve uma diferença significativa desses números, com mais nascimentos de meninas. Segundo a pesquisadora Ana Júlia Lichtenfels, existem três hipóteses para o fenômeno. A primeira é a de uma interferência direta na formação das células reprodutivas, que ocorre no testículo. O cromossomo Y (definidor do sexo masculino) é mais frágil do que o cromossomo X (definidor do sexo feminino). Portanto, os meninos seriam mais afetados pelos agentes tóxicos encontrados no ar poluído. Ou seja, as meninas já sairiam com vantagem na corrida pela vida.
A segunda hipótese é da interferência dos hormônios ao redor da fertilização. Isto é, dentro do útero existe um ambiente hormonal que pode influenciar na escolha dos tipos de espermatozóide de acordo com os níveis hormonais presentes na circulação sanguínea da mãe. Como alguns compostos orgânicos existentes no ar poluído são capazes de imitar o estrógeno - hormônio feminino - há uma maior concentração desse e, consequentemente, uma maior predisposição para o nascimento de meninas. Ana Júlia ainda lembra que, no homem, esses mesmos compostos podem inibir a produção de testosterona – hormônio masculino – gerando problemas de fertilidade, como uma queda no número de espermatozóides produzidos.
O último caso seria o maior número de abortos que ocorrem com bebês do sexo masculino. Por causa da fragilidade do cromossomo Y, os meninos seriam mais suscetíveis aos agentes externos da poluição. Assim, as meninas têm mais chances de sobreviver no período de gestação do que eles. Além disso, as perdas do embrião antes da implantação no útero – chamadas pré-implantacionais – também se tornaram mais comuns. O que acontece é que após a fecundação (união do óvulo e espermatozóide), que ocorre na trompa uterina, o embrião leva três dias para alcançar o útero e se fixar, mas muitos não conseguem ultrapassar essa fase, porque estão mais frágeis, e a mulher não engravida.
Em estudos mais recentes, verificou-se que a poluição também contribui para a má formação da placenta que, por sua vez, relaciona-se com o baixo peso dos recém-nascidos. Como a nutrição, proteção e eliminação de resíduos do feto são de responsabilidade da placenta, todas essas funções estão comprometidas se essa não é bem formada, o que é mais comum nas mulheres que vivem em ambientes onde o ar é poluído.