São Paulo (AUN - USP) - A mídia influi diretamente na construção e desconstrução da imagem de esportistas como mitos ou heróis. Ao dar ou não espaço para eles em sua agenda, exaltar determinada característica, ou mesmo omitir algo a respeito do atleta, a mídia faz uso do seu poder enquanto formadora de opinião para moldar a imagem do mesmo.
De acordo com a professora Kátia Rúbio, que realiza um estudo sobre o fenômeno dos atletas-heróis, “a principal responsável pela idolatração de atletas da forma que temos hoje é a mídia”. Nos moldes que a imprensa esportiva de hoje explora o esporte, “os atletas são transformados em um produto da mídia tal qual um participante do Big Brother”, diz a pesquisadora.
Há diversos exemplos disso. “Quem não se lembra das musas do vôlei?”, pergunta Kátia. O caso é ilustrativo. A seleção brasileira feminina de vôlei teve uma explosão de exposição durante a década de 90. Jogadoras como Fernanda Venturini, Ana Paula e Ida chamaram a atenção da mídia tanto por seu voleibol quanto por sua beleza física, e passaram a ter destaque até então inédito para o seu esporte. Começaram a aparecer diariamente nos noticiários esportivos, seus jogos eram transmitidos ao vivo em cadeia nacional e suas vidas particulares eram esmiuçadas para um público cativo e crescente. Assim, a imagem das jogadoras foi construída à semelhança de deusas, que seriam perfeitas em sua aparência e profissão. “Quem construiu isso foi a mídia, e não elas mesmas”, comenta Kátia. Quando Ana Paula deu declarações preconceituosas referentes às adversárias cubanas, os meios de comunicação não deram tanto destaque quanto deram à Ida no momento em que esta aceitou posar nua para uma revista masculina.
Mas nem sempre esse tratamento da mídia é positivo para a imagem do atleta. “O Animal, jargão criado pelo [locutor] Osmar Santos para o jogador [de futebol] Edmundo para descrever positivamente as performances do atleta, pegou de tal forma que atrapalhou a carreira do atacante”, afirma Kátia. De fato, a partir daí a fama de bad boy se firmou definitivamente, e nas vezes que o jogador tentou se desvencilhar do rótulo ele foi crucificado por toda a mídia no primeiro deslize, fosse uma expulsão de campo ou uma confusão na praia. Assim, criou-se uma imagem de anti-herói de Edmundo.
No entanto, às vezes a mídia caminha no outro sentido. “No recente caso do [jogador de vôlei] Giba, todos os veículos correram para dizer que ele é um bom menino”. Ela se refere ao escândalo no qual o atleta foi pego no exame antidoping, acusado de fumar maconha. Giba é um atleta muito bem quisto pela mídia atualmente, talvez por apresentar características semelhantes às das Musas do Vôlei.
Para a pesquisadora, “este modelo de exposição e exploração persiste até hoje. Podemos observá-lo no jogador de futebol Kaká”. Conforme AUN-USP apurou, o atleta realmente recebe atenção diferenciada por parte dos noticiários esportivos. Para citar alguns exemplos, a Folha de S. Paulo destinou recentemente a maior parte de uma contra-capa do caderno de esportes para matéria sobre a negociação do atleta acerca dos direitos de sua imagem. A Rede Globo de Televisão exibiu matérias com o atleta assistindo à final do Campeonato Paulista de 2003 pela televisão (por estar lesionado) diversas vezes. A maior parte das emissoras de TV fez reportagens em mais de um dia da semana retrasada sobre a volta de Kaká aos gramados – coisa que não costumam fazer com a maioria dos atletas. “As mídias assumiram um papel de válvulas propulsoras do espetáculo que se tornou o esporte hoje”, conclui Kátia.