São Paulo (AUN - USP) - A questão ambiental possui um componente social importante, já que tanto ricos quanto pobres são "responsáveis", embora de maneiras diferentes, pela poluição do meio ambiente, enquanto os meios utilizados para a produção de energia são determinados, entre outros fatores, pelo capital. Foi o que defendeu o professor José Goldemberg, ex-reitor da USP e Secretário Estadual de Meio Ambiente, em conferência realizada como parte das comemorações de 47 anos do Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares (Ipen).
Para Goldemberg, isso se explica pelo seguinte: as camadas mais pobres da população, sem acesso à moradia, se vêem forçadas a ocupar determinadas áreas, geralmente situadas fora do perímetro urbano original das cidades. Essas áreas não dispõem de infra-estrutura para acolher os ocupantes, que passam a jogar o esgoto produzido em cursos da água, muitos dos quais compõem os mananciais que abastecem os moradores das cidades próximas. Além disso, as ocupações não são feitas sem outros danos ao meio ambiente, como o desmatamento de porções de florestas remanescentes e que deveriam ser preservadas.
Por outro lado, a população mais abastada, se tem a sua disposição uma rede de saneamento básico eficiente, não contribuindo tanto para a poluição das águas, acaba sendo a "responsável" pela maior parte da poluição atmosférica das grandes cidades. É que entre se locomover num ônibus velho e lotado e num carro não necessariamente novo, mas apenas seu, as pessoas preferem a segunda opção. Assim, a emissão de poluentes no ar aumenta, degradando ainda mais a vida urbana.
No entanto, a responsabilidade por esses danos ambientais não pode ser totalmente atribuída aos cidadãos. Na verdade, o que se percebe é a falta de uma intervenção mais forte por parte do poder público em ambas as questões, de saneamento e transporte. O Estado não consegue, em parte por razões econômicas, como restrições orçamentárias, atender às demandas da população na velocidade exigida, resultando, nesse caso, num lapso nos sistemas de saneamento e transporte público, que culmina em danos ambientais, os quais, principalmente sob o ponto de vista econômico, são ainda mais custos de serem resolvidos.
A questão econômica, segundo Goldemberg, acompanhada de componentes ambientais e relativos à saúde, também é determinante na produção de energia, bem como no desenvolvimento de novas alternativas para fazê-lo. Se, de acordo com um relatório divulgado pela ONU em 2002 e citado pelo secretário, aproximadamente 78% das fontes de energia utilizadas no planeta são oriundas de combustíveis fósseis, ou seja, não-renováveis, isso se deve, em parte, ao risco financeiro que representa para as empresas do setor, bem como para os governos, o desenvolvimento de processos alternativos frente aos elevados dividendos obtidos da exploração das fontes convencionais.
Assim, as "infant nascents", como são denominadas essas fontes alternativas, ainda são pouco atrativas, já que apresentam baixa produtividade por capital investido. Ficam restritas, sobretudo, a regiões onde as condições ambientais são extremamente favoráveis. "Não é na Dinamarca que venta pra burro?", brinca Goldemberg, numa referência ao país europeu que produz quantidade expressiva de energia eólica, a qual é oriunda do movimento de hélices movidas pelo vento. E, no futuro, o que farão os lugares onde não "venta pra burro"?
Sem dúvida, há outras alternativas, como a biomassa moderna, que corresponde, segundo o mesmo relatório, a apenas 2,1% do consumo mundial, e na qual o Brasil é um exemplo. Cerca de 70% da produção de álcool, melhor exemplo dessa espécie de combustível, do mundo é feita em nosso território, que utiliza 35,4% de energias renováveis em relação ao total consumido, um dos maiores índices do mundo, ficando atrás apenas daqueles apresentados por Suécia e Noruega, respectivamente. No entanto, ainda é alto o índice brasileiro de consumo de petróleo, Aproximadamente 47% da energia aqui utilizada provém dessa fonte, em grande parte devido ao modelo de transporte adotado a partir dos anos 60, baseado em rodovias.