São Paulo (AUN - USP) - No dia primeiro de junho, o professor Gustavo Mônaco debateu com alunos da Faculdade de Direito da USP os rumos dos estudos em Direito Internacional Privado. A apresentação fez parte da série de mini-workshops promovidos pelo Departamento de Direito Internacional entre os dias 26 de maio e 6 de junho.
O Direito Internacional Privado regulamenta as relações entre pessoas físicas ou jurídicas que envolvam mais de um país ou nacionalidade. Para resolver essas questões, o juiz responsável pelo caso indica, entre as legislações dos países em conflito, qual deve ser aplicada.
No Brasil, essa esfera jurídica é pouco discutida, tanto na prática legislativa quanto nas pesquisas acadêmicas. Para Gustavo, isso se deve, em parte, à retirada da disciplina de Direito Internacional Privado da grade curricular obrigatória das faculdades brasileiras pelo governo da Ditadura Militar (1964-1985). “O nacionalismo dos militares refletiu no ensino jurídico”, afirma.
Legislação escassa
As únicas universidades que continuaram lecionando nessa área durante a Ditadura foram a USP e as cariocas Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ). “Os alunos dessa geração que não estudaram nessas universidades não sabem sobre Direito Internacional Privado”, avalia.
Isso causou um despreparo geral entre os magistrados brasileiros para lidar com esse tipo de caso. Apesar de o Brasil seguir as convenções internacionais, Gustavo afirma que as normas do país são genéricas. “Há uma indefinição. Não podemos chegar a uma conclusão apenas lendo a legislação brasileira”.
Além disso, para escolher que lei aplicar em cada situação, o juiz brasileiro deveria estudar o direito estrangeiro, o que, segundo o professor, não é comum. “O Direito Internacional Privado exige do magistrado que ele pense como um juiz estrangeiro. Mas as pessoas não sabem lidar [com esses casos] e tratam como um problema nacional”, alerta.
Desinteresse na Academia
Não é apenas nos tribunais brasileiros que a compreensão do Direito Internacional Privado é restrita. As produções acadêmicas na área são raras entre os pesquisadores da USP. Segundo Gustavo, apenas três dos 14 professores do Departamento de Direito Internacional trabalham com o tema.
Para o professor, o desinteresse se deve à forma como a disciplina é ministrada no curso de direito do Largo São Francisco. Ele acredita que o conteúdo geral obrigatório é doutrinário e desatualizado. “Não é nada diferente do que estudaríamos na Universidade de Bologna [a mais antiga do mundo] na época em que foi fundada”, brinca.
Para contornar essa situação, Gustavo explica que serão abertas disciplinas optativas, a partir deste ano, para fornecer matérias especiais em Direito Internacional Privado. “Isso abrirá espaço para vários temas de pesquisa”, afirma. O foco do professor, porém, são os problemas nas relações familiares em âmbito internacional, como a adoção, a guarda de filhos e os direitos da criança.
“Ninguém escreve sobre o assunto, mas é internacionalmente importante, está sempre nos meios de comunicação”, defende. Basta lembrar do menino Sean Goldman, nascido nos EUA e trazido para o Brasil pela mãe, Bruna Bianchi.
Depois da morte de Bruna, em 2008, o pai, David Goldman, passou a disputar a guarda do filho, que conquistou no ano seguinte. O caso ganhou repercussão internacional e, recentemente, voltou a aparecer nos canais de TV americanos após David publicar um livro sobre a história.
Cumprindo o objetivo do mini-workshop, Gustavo apresentou possibilidades e convidou os alunos a pensarem sobre as linhas de pesquisa em Direito Internacional Privado. Ele ressaltou a importância do trabalho com temas de grande relevância pública, como uniões estáveis e sucessões patrimoniais. “São temas que deveriam ser discutidos, bem pensados e bem trabalhados a nível científico”.