São Paulo (AUN - USP) - Os recentes episódios de discriminação, assédio e opressão por motivos diversos que, em alguns casos, recebem até o nome de bullying, têm suscitado constantemente as discussões sobre preconceito e tolerância na sociedade.
Com a intenção de identificar preconceitos veiculados na publicidade através de estereótipos e incorporados aos modos de subjetivação na adolescência, a psicóloga Marian Ávila de Lima e Dias Ferrari, doutora pelo Instituto de Psicologia (IP) da Universidade de São Paulo (USP) e membro do Laboratório de Estudos sobre o Preconceito da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), realizou uma pesquisa com adolescentes de classe média, com idades entre 12 e 17 anos.
A psicóloga entregou uma fita de vídeo e uma máquina fotográfica para cada um e solicitou que gravassem quantas peças publicitárias quisessem e que fotografassem momentos da televisão na vida deles.
Depois de um tempo, a psicóloga retornou e marcou uma entrevista para que todos juntos assistissem ao que foi gravado. A partir da análise dos 77 comerciais gravados, apenas dez deles continham a presença de pessoas significativamente diferentes. “Em todos estes dez comerciais a diferença registrada era a presença de atores negros. Num destes comerciais, além de atores negros havia também uma atriz oriental”, observa Marian.
A psicóloga afirma que o preconceito se manifestou de forma sutil pelos adolescentes nas afirmações que faziam de que os modos de vida e modelos imagéticos retratados nos comerciais eram os corretos, os "bons". Portanto, subentende-se que eles não considerariam tão positivamente alguém muito desviante desses modelos. “Quando perguntava diretamente a algum deles se eles tinham preconceito contra negros, a resposta era sempre negativa.”
Marian questionou a ausência de outros tipos sociais nos comerciais e, de modo geral, os adolescentes pareceram não se importar com a pouca diversidade ali demonstrada, a psicóloga relata até um episódio: “Houve uma adolescente que, ao comentar sobre um comercial de jeans, disse: ‘é, toda jovem tem namorado, faz ballet e escreve na agenda, bem como está descrito nesse comercial.’ Vejam que a referência dela é essa! Ela nem imagina outros modos de ser e viver a adolescência.”
Nesse processo, a psicóloga acredita que as maiores marcas da influência da indústria cultura no processo da construção da subjetivação seriam a frieza e a não-identificação com o outro.
Marian, que registrou os resultados da pesquisa em sua tese de doutorado Preconceito na publicidade televisiva: vozes e olhares de adolescentes, percebe que está havendo uma progressiva elevação da presença de atores negros, mas que os estigmas sociais permanecem os mesmos. “É falsa a ideia de que no Brasil o nosso preconceito é contra a figura do pobre. De um modo geral, o brasileiro tem sim, preconceito contra essa figura, mas os demais estigmas são marcas ainda muito fortes que se sobrepõem à questão da pobreza.”
Na época atual, com os crescentes debates e discussões acerca do fenômeno do bullying, a psicóloga teme que essa questão perca a intensidade e se transforme em produtos: livros, palestras caras sobre o tema, medidas policialescas como câmeras e punições, sem que de fato haja uma discussão eficaz sobre o temor ao diferente e sobre a excessiva busca pela padronização das condutas e dos sujeitos.