São Paulo (AUN - USP) - O professor Cláudio Possani, do Instituto de Matemática e Estatística da USP (IME-USP), apresentou o projeto de pesquisa sobre história da matemática que está desenvolvendo juntamente com o professor Carlos Henrique B. Gonçalves, da USP-Leste. A palestra abordou a evolução das idéias matemáticas na vertente da probabilidade geométrica, fazendo uso de conceitos simples da área e de seus problemas mais emblemáticos. Por meio destes, os pesquisadores questionam a existência e validade das escolhas ditas aleatórias.
Um caso que ilustra a ideia defendida é o primeiro problema de probabilidade geométrica, descrito em 1777 por Buffon em seu livro “Ensaio sobre Aritmética Moral”. Consistia em determinar quais as chances de agulhas, se jogadas aleatoriamente, cortarem as divisórias das tábuas que compunham o chão de muitos salões da nobreza francesa; era um jogo comum da época. Utilizando as variáveis de tamanho da agulha e largura das tábuas chega-se à probabilidade pedida.
O interessante, pontuado pelo professor, é que Buffon nunca chegou a finalizar suas contas neste problema matemático, apesar de chegar a desenvolver um cálculo a respeito. A conclusão apresentada pelo teórico é que o tamanho da agulha deve ser aproximadamente ¾ da largura das tábuas para que haja possibilidade de vitória. O que Buffon pretendeu em seu livro foi esclarecer as pessoas acerca das chances de que dispunham em determinadas situações para que pudessem, assim, identificar aquelas em que havia honestidade, ou seja, chances iguais de cada participante ganhar. Ou seja, o intuito era ajudar a população na tomada de decisões.
A partir deste antigo problema matemático, o professor diz que, em experimentos feitos com o jogo, as pessoas não atiravam suas agulhas ao chão de maneira aleatória, mas sim visando a divisória das tábuas, a fim de vencer o desafio. Desta forma, a probabilidade encontrada no cálculo de Buffon nunca era alcançada. “Quando as pessoas agem com a intenção de ganhar, as chances de que isso aconteça são maiores”, afirma Possani, demonstrando através de cálculos matemáticos.
Outro exemplo de problema clássico de probabilidade geométrica que põe em xeque o conceito de aleatoriedade data de 1889, com autoria de J. Bertrand. Na questão proposta por ele, desejava-se saber qual a chance de que a medida de uma corda traçada ao acaso em uma circunferência fosse maior do que a medida dos lados do triângulo eqüilátero inscrito nela. Parece complicado, mas, fazendo os cálculos, chega-se a três respostas. Alguns especialistas dizem que não há certas ou erradas, mas que o problema está mal posto. Outros afirmam que todas estão corretas e constituem diferentes maneiras de se abordar a questão. Por meio de uma significativa propriedade geométrica chega-se a uma solução aparentemente mais apropriada.
O importante aqui é que tudo gira em torno de cordas desenhadas na circunferência pretensamente de modo aleatório. Mas não é assim, como diz o professor Possani: “Nenhuma pessoa, especialmente uma criança, irá desenhar uma corda pequena, a grande maioria quer fazer uma que atravesse o centro da circunferência; já fiz experimentos que comprovam isso”. Desta forma, o pesquisador faz coro ao questionamento - que incide também sobre áreas da biologia, por exemplo - sobre o que é e se de fato existe aleatoriedade no comportamento humano; ou se cada ação já está predeterminada por algum fator, seja ele externo ou interno.