ISSN 2359-5191

05/11/2003 - Ano: 36 - Edição Nº: 20 - Meio Ambiente - Instituto de Pesquisas Energéticas
Ipen pesquisa processo alternativo de obtenção de energia

São Paulo (AUN - USP) - Antigamente, quando uma dona de casa não tinha fogão a gás, a solução era cozinhar no fogão de lenha. Se não dispunha de madeira para queimar, ela ia até o armazém mais próximo e comprava uma certa quantidade de lenha cobrada por metro. Dentro de algum tempo, podemos ter algo parecido com isso. Só que, em vez de madeira, compraremos álcool ou outro combustível para produzir hidrogênio e, a partir daí, energia elétrica que serviria não apenas para cozinhar, mas também supriria todas as necessidades energéticas de uma residência.

Trata-se da célula a combustível, um gerador de energia que se baseia num processo diferente da combustão, não produzindo, portanto, aqueles componentes oriundos da queima de combustíveis fósseis e que poluem a atmosfera, notadamente o monóxido de carbono (CO). Outra vantagem consiste na eficiência que as células apresentam se comparadas com outras formas de obtenção de energia, permitindo uma otimização no uso de materiais e substâncias usadas como combustíveis. Países desenvolvidos, como Estados Unidos, Canadá, Japão e Alemanha, já se encontram bem avançados nesse tipo de tecnologia. A Europa, por exemplo, espera contar até o final da década com os primeiros carros movidos por esse processo.

No Brasil, várias instituições de pesquisa se dedicam ao desenvolvimento de uma tecnologia nacional para o setor. Uma delas, o Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares (Ipen), realiza trabalhos na área há cinco anos. Segundo, José Augusto Perrotta, coordenador do programa célula a combustível do Ipen, o objetivo é desenvolver aplicações da tecnologia para seu uso estacionário, ou seja, em imóveis, sejam eles residenciais ou comerciais.

Hoje existe um modelo de produção de energia centralizado, dependente de grandes unidades, como as usinas hidroelétricas. Para que essa energia chegue aos consumidores, são necessárias extensas linhas de transmissão, que podem romper-se, como ocorreu no caso do “apagão” que deixou Florianópolis às escuras durante alguns dias da semana passada. “[Com a célula a combustível,] em vez de você receber energia elétrica em sua casa, você receberia um tipo de combustível, como o gás natural”, diz Perrotta. Esse combustível seria reformado, ou seja, convertido em hidrogênio num equipamento específico, chamado reformador. Há também a possibilidade de existir o fornecimento do hidrogênio diretamente às pessoas. Assim, não seria necessário que cada imóvel possuísse um reformador acoplado à sua célula ou grupos de células.

O princípio de funcionamento da célula a combustível consiste na combinação eletroquímica de hidrogênio com oxigênio. Do processo, resultam corrente elétrica, água, que geralmente sai na forma de vapor, e calor, o qual pode ser usado para aquecimento. Numa possível situação de aplicação prática, diferentes células ou grupos estariam conectados entre si, de modo que, se num determinado momento uma unidade estivesse produzindo mais energia que a demanda do local, poderia abastecer outro ponto consumidor cuja unidade não estivesse conseguindo suprir as necessidades daquele.

A célula pode ser feita de cerâmica ou polímeros. De acordo com Fábio Coral Fonseca, coordenador de materiais cerâmicos do projeto, é mais complicado desenvolver equipamentos feitos do primeiro tipo de material, pois, devido à quantidade de calor liberada durante as reações químicas que ocorrem em seus interiores, lidam com temperaturas elevadas, próximas à 1000º C. Assim, é necessário desenvolver cerâmicas que reúnam as propriedades necessárias para que as células desse tipo consigam operar por longos períodos de tempo. No instituto há também um grupo que se dedica apenas à pesquisa das células poliméricas. “A tendência atual é que as células cerâmicas serão mais adequadas para aplicações estacionárias”, afirma.

Fátima Maria Sequeira de Carvalho, coordenadora do setor de reforma de combustíveis do grupo do Ipen, diz que atualmente as pesquisas são feitas com hidrogênio derivado do álcool, mas em breve outros tipos de biomassa, como milho e trigo, poderão ser empregados nos experimentos. Embora haja a possibilidade de utilizar combustíveis fósseis para a obtenção do hidrogênio, o grupo realiza suas pesquisas considerando apenas fontes renováveis de energia, por levar em conta questões ambientais.

Sobre a viabilidade da tecnologia, diz Fábio, “as células a combustível vêm para suprir determinados nichos de mercado inicialmente”. Segundo ele, o “maior [fator] limitante [do uso dela] é seu custo”. Por isso residências e pequenos estabelecimentos comerciais não devem contar com esse processo de geração de energia em breve. Atualmente, devido à alta confiabilidade das células, algumas operadoras de cartão de crédito as usam em seus escritórios como alternativa no caso de haver, por exemplo, interrupção no fornecimento de energia, não havendo necessidade, assim, de paralisar as atividades da empresa. Todavia está implicada, num longo prazo, a transição para uma sociedade dependente de combustíveis fósseis, como aqueles derivados de petróleo, para uma baseada em fontes renováveis, como a biomassa.

De acordo com Perrotta, os próximos passos do Ipen no desenvolvimento de células a combustível será a criação de estratégias visando a melhor exploração dos benefícios advindos delas, inclusive sob o ponto de vista comercial. Mas ressalta: “somos um instituto de pesquisa. Então, não vamos produzir isso em escala. Vamos dar suporte ao país a implementar esse tipo de tecnologia”.

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