São Paulo (AUN - USP) - As questões que envolvem a água no Direito Internacional não são mais as mesmas. Essa é a constatação de Paulo Canelas de Castro, professor da Universidade de Coimbra, em Portugal, e da Universidade de Macau, na China. Em palestra no Instituto de Estudos Avançados (IEA) da USP, o docente apresentou as principais mudanças ocorridas nas duas últimas décadas, que primam majoritariamente pela aproximação do tema à vida humana.
Desde meados da década de 1990, o assunto não é abordado da mesma forma pela comunidade internacional. Segundo o professor, o Direito passou a contemplar uma nova dinâmica tendo como objetivo unir desenvolvimento econômico e respeito às limitações da natureza, além de trazer as discussões para mais perto da população. Houve uma humanização no Direito, que começou a se preocupar com o acesso à informação sobre a água, a consequente participação efetiva das pessoas comuns na tomada de decisão, a garantia de justiça social.
Os sinais mais claros da mudança que estava por vir se deram em conferências e debates que envolveram toda a comunidade. Novos tratados e resoluções foram oficializados em tribunais internacionais, que, no momento, já estavam sensibilizados com questões como a escassez e a má distribuição da água, sua poluição por acidentes industriais, ausência de conscientização da população acerca do tema, secas ocasionais e enchentes.
De acordo com Castro, a água sempre consistiu em ramo adormecido no direito internacional, sendo neutro, “modesto”. A ausência de imposições mais contundentes, a abstração excessiva do tema e a consideração, em muitos casos, de reservatórios de água apenas em regiões de fronteira contribuíram para isso. “Nos tratados, era levada em conta somente a porção de água que estava na fronteira entre dois países, sem apreciação do todo. Rios e lagos inteiros, fontes importantíssimas de obtenção desse bem, eram muitas vezes ignorados pelo simples fato de que não se encontravam entre duas nações”, afirma.
Esse modelo passou a ser criticado quando percebeu-se que ele não conseguia mais responder às necessidades humanas. Além de não dar espaço para modificações futuras, que surgiriam concomitantemente com as mudanças sociais e ambientais mundiais, ele apresentava “uma visão restrita ao momento jurídico da elaboração das disciplinas. Muitas das resoluções enfrentavam a impossibilidade de aplicabilidade prática para a população mundial, pois não tinham sido pensadas com esse teor”, explica Castro. “Elas eram fragmentadas, faltava coerência com a sustentabilidade e a preocupação com as pessoas, que sentem ‘na pele’ os problemas relacionados com a água”.