São Paulo (AUN - USP) - Em seminário realizado recentemente na Faculdade de Economia e Administração (FEA) da Universidade de São Paulo (USP), foi apresentada uma pesquisa inédita no Brasil sobre as condições dos trabalhadores com deficiência. O estudo é da Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (Fipe), em parceria com a Secretaria dos Direitos da Pessoa com Deficiência, e tem apoio da Associação Brasileira de Recursos Humanos do Estado de São Paulo (ABRH- SP) e do Centro de Integração Empresa-Escola (CIEE).
A amostragem foi de 1.200 pessoas com e sem deficiências de todos os tipos – 67,6% dos participantes com deficiência apresentam debilidade física –, contabilizando-se os questionários válidos. A pesquisa foi realizada online através do método Survey, que disponibiliza uma senha individual para cada participante. Foram convidados trabalhadores de empresas associadas à ABRH-SP ou que foram colocados por organizações no mercado de trabalho. A composição foi de dois questionários, um para as pessoas com deficiência e outro para as sem, com cerca de 150 perguntas cada, relativas à visão do trabalhador quanto às suas condições de trabalho. A margem de erro é de 4% para mais ou para menos.
A média etária das pessoas com deficiência empregadas no mercado de trabalho é superior à das que não tem deficiência, variando de 25 a 30 anos para aquelas para até os 25 anos para estas. Outro dado preocupante apresentado é o de que 4,7% das pessoas com deficiência começaram a trabalhar com 10 anos de idade, enquanto que para os que não têm deficiência esse número cai para 0,3%, o que leva a pensar que os trabalhadores com deficiência entram no mercado de trabalho muito cedo ou tarde demais.
Um pouco mais de 30% das pessoas sem deficiência trabalham nas indústrias de transformações, enquanto a taxa é de 6,3% para as pessoas com deficiência. No campo da educação o problema é similar: apenas 5,7% das pessoas com deficiência estão empregadas neste ramo, comparadas com 11,8% das pessoas sem deficiência. Aquelas tendem a trabalhar em empresas de grande porte e 72,2% nunca foram promovidas, apesar de trabalharem em suas empresas o mesmo tempo do que as pessoas sem deficiência. Destas, somente 63,7% não tiveram promoção. Apenas 2,4% das pessoas com deficiência ganham menos do que um salário mínimo, comparadas com 15,8% das que não têm deficiência. Contudo, a proporção dos que veem seu salário como abaixo do corrente no mercado é maior entre as que têm deficiência. Outro dado díspare é que 74,7% destas trabalham para se sustentar, enquanto que este é apenas o quinto motivo de maior importância para a pessoa sem deficiência ir trabalhar.
Enquanto a pessoa sem deficiência vai de carro ao trabalho (47,7%), a com deficiência utiliza mais o transporte público. Sessenta e cinco por cento destas vão de van para o emprego e 27,8% fazem uso do metrô. Neste meio de transporte, apenas 5,9% das pessoas sem deficiência se transportam. Os que se declararam brancos entre os participantes com deficiência correspondem a 68,1% e entre os que não têm deficiência esse número é de 80,2%.
A pesquisa tem ainda vários outros dados relevantes, como quanto aos equipamentos de trabalho e de acesso às pessoas com deficiência (locomoção/elevador, sinalização, mesa de trabalho adaptada). Em geral, as pessoas com deficiência não consideram esses dispositivos adequados, ainda que percebam uma evolução com relação à época em que foram admitidos no emprego. A visão que predomina no final da apresentação do estudo é de que as pessoas com deficiência mais realizadas profissionalmente são as que apresentam um olhar mais positivo com relação à vida.
Ana Maria Barbosa, coordenadora da Rede Saci, uma vertente do Programa USP Legal que presta auxílio às pessoas com deficiência, diz discordar desta leitura: “Nós observamos o trabalho da pessoa com deficiência há anos, claro que nunca com uma pesquisa dessa natureza, mas temos um panorama da situação dessas pessoas e sabemos que elas têm deficiência, não estão conseguindo emprego com facilidade, querem trabalhar e quando o conseguem são colocadas de lado, sem nada para fazer”, diz. “Agora, se elas são simpáticas ou não e que postura apresentam diante da vida, eu não sei. O mercado de trabalho é muito difícil para essas pessoas, é natural que elas estejam insatisfeitas”, continua Ana Maria, completando seu raciocínio com: “Então, eu acredito muito nos dados, eles de fato refletem a condição do trabalhador com deficiência, mas não acredito nessa interpretação deles que está sendo feita”.
O que Ana Maria diz achar bastante positivo na pesquisa realizada pela Fipe é que ela constitui uma ferramenta para que se discuta mais o acesso e condições das pessoas com deficiência ao mercado de trabalho, não de uma maneira superficial, e diz também esperar que se investigue melhor as empresas que oferecem vagas às pessoas com deficiência, a fim de verificar se elas estão adaptadas para receber esses indivíduos ou não.