São Paulo (AUN - USP) - Além da acepção de Geografia comumente usada, de ciência que tem por objeto a descrição da Terra e, em particular, o estudo dos fenômenos físicos, biológicos e humanos que nela ocorrem, existe outro significado para o termo, que pode designar qualquer arranjo estrutural ou sistêmico das partes de um conjunto. Com base nisso, nasceu o conceito de “Geografia do Cinema”, apresentado por Wenceslao Machado de Oliveira Jr. em palestra realizada na Escola de Artes, Ciências e Humanidades (EACH) da USP.
Professor da Faculdade de Educação da Unicamp, Oliveira Jr. diz que a tal “Geografia do Cinema” consiste no arranjo das produções textuais assentadas nas imagens e sons, sequências e sentidos que os filmes nos apresentam. Do encontro entre os universos culturais de cada um de nós e as imagens e os sons de cada filme emergem aspectos estruturais desses elementos cinematográficos que se organizam entre si, configurando construções imaginativas e interpretativas que se dão numa região em que os universos culturais das pessoas são sugados para o interior da narrativa cinematográfica, e a narrativa para o interior desses universos culturais. Essa modalidade de estudo, no entanto, não é uma produção somente subjetiva e imaginativa, pois também está amparada nas imagens e nos sons do filme, que são objetivos em sua materialidade.
Para Oliveira Jr., durante a projeção de um filme, principalmente no cinema, dificilmente conseguimos nos distanciar das imagens e dos sons. Somos forçados a nos permanecer atentos e impedidos de pensar sobre algo. O entendimento do enrendo, muitas vezes, se dá muito mais por aspectos sensíveis do que inteligíveis, e esta forma de compreensão se aproxima muito mais da experiência literária do que da experiência científica, por exemplo. Desta forma, a “Geografia do Cinema” se propõe, acima de tudo, a pensar o filme, a estender a apreensão e a compreensão não apenas com relação às deduções do enredo, mas sobre cada imagem, cada diálogo ou sequência em particular. “Continuamos o filme para dentro dele; e não a partir dele”, explica o professor.
A proposta, por si só, é ousada, uma vez que busca desliteralizar as interpretações habituais dadas aos filmes. No entanto, segundo Oliveira Jr., a intenção, ou pretensão, é criar uma proposição educativa, além de poética, das obras do cinema. Ao se dedicar a olhar para os filmes, buscando a tal continuação interna, ele acredita estar não só criando reverberações subjetivas, mas também buscando entender o sentido que o filme deixa para nós, espectadores, criando mecanismos com alto poder pedagógico. Para isso, é preciso pesquisar as imagens e sons para descobrir onde elas geraram o sentido que nos ficou, o território no qual localizamos os personagens, a geografia na qual estes vivem e agem. É preciso pesquisar as imagens e sons para descobrir se isso irá gerar ratificações ou retificações.
A “Geografia do Cinema”, no primeiro momento, está mais ligada à sensação que o filme causa do que com a trama ou o conteúdo que ele contém ou representa. Até por isso, a intenção de produzir um arranjo estrutural dessa magnitude, segundo o professor, é a de pensar e inventar outras interpretações para o mundo e permitir olhares diferenciados e diversificados para todas as coisas presentes na vida do homem, e não só para os filmes.