São Paulo (AUN - USP) - Lançado no final do ano passado, o livro “Democracia, Mercado e Estado: o B de Brics” procura analisar o impacto das reformas econômicas na qualidade da democracia no Brasil. A obra é resultado de uma extensa pesquisa que compara os processos decisórios da formulação das políticas econômicas em três países latino-americanos: Brasil, Chile e Argentina. O livro foi organizado por Lourdes Sola, pesquisadora do Núcleo de Pesquisa de Políticas Públicas (NUPPs) da Universidade de São Paulo (USP), e por Maria Rita Loureiro, professora da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade (FEA) da USP.
A escolha dos países estudados não foi aleatória. De acordo com Sola, os três pertencem a uma mesma família de países com características estruturais parecidas — as democracias de mercados emergentes — e servem de exemplo para o principal problema discutido no estudo: como abordar a inserção desses países no mercado internacional em meio à era da globalização. Afinal, todos eles pertencem à periferia, passaram por um processo de redemocratização e foram expostos a diversos choques externos desde então. Como eles lidaram com o processo de legitimar as reformas que foram feitas para responder à necessidade de credibilidade no mercado?
Segundo a pesquisadora, os três países têm respostas diferentes para a questão, mas também conservam características comuns. Entre elas, estão a liberalização do comércio internacional como forma de integração e as reformas previdenciária e do sistema financeiro. “Qual foi a agenda da globalização nestes anos e como cada Estado decantou isso? Tínhamos que analisar o mercado como indutor de mudanças, combinado com o poder de fogo do eleitorado”, aponta.
No caso brasileiro, a crise econômica sempre foi um pressuposto. Com uma maior inserção do país no mercado, foi preciso lidar com novos desafios. “O Brasil, a partir de 2005, tinha um novo cenário. Ele estava integradíssimo ao mercado”, afirma. Além disso, a democracia brasileira tem particularidades. O país é o único da América Latina, por exemplo, em que a reforma constitucional veio junto com o ajustamento democrático. “A Constituição, para nós, é a constrição legal de uma ruptura”, diz Sola.
Crise de 2008
Com um ano e meio de pesquisa, o estudo sofreu um forte abalo: com o estouro da crise econômica de 2008, os cenários estudados iniciaram uma nova transformação. “Aconteceram mudanças dramáticas no eixo de poder global”, afirma Lourdes.
Ela explica que, primeiro, houve uma alteração na própria inserção dos países e, em seguida, percebeu-se que a periferia mundial não era mais a mesma. Para Lourdes, é interessante notar que os especialistas não só não viram a crise, como também tiveram dificuldade em assimilar essas mudanças de inserção. “Em 2008, ainda se acreditava que a solução da crise se dava no Atlântico Norte”, diz.