São Paulo (AUN - USP) - Entender o poder da imprensa sobre o espaço público é extremamente importante. Mesmo porque esta exerce uma forte influência sobre a vida cotidiana da população. E demonstra na forma de veiculação, a ética jornalística. Neste sentido, a pesquisadora Cláudia Malinverni desenvolveu um estudo junto à Faculdade de Saúde Pública (FSP) da USP que envolveu a análise de discurso de notícias veículadas pelo Jornal Folha de São Paulo sobre a febre amarela silvestre entre dezembro de 2007 e fevereiro de 2008, e a ocorrência da doença em humanos A Constatação foi de que as informações levadas aos leitores do jornal geraram a sensação de insegurança. Afinal, tal doença seria um acontecimento epidêmico, perigoso, letal e caso emergencial da saúde pública que estaria assombrando todo o país, conforme muitos dos textos divulgados pelo jornal.
Claúdia verificou que foram feitas 118 matérias sobre o tema em 9 estilos diferentes. Destas 37,7% tiveram enfoque subjetivo, variando entre notas, textos opinativos, cartas de leitor e editorial. Apenas 9,5% trataram o assunto objetivamente, como foi o caso das entrevistas pingue-pongue em que, além da transcrição fiel das perguntas e respostas, é destacada a especialização do entrevistado e há uma maior credibilidade quanto as informações fornecidas. Variando entre a objetividade e a subjetividade, as reportagens representaram 25,5% das matérias.
Segundo a análise das informações fornecidas, a pesquisadora demonstra também que há nas matérias a ausência de apuração ou mesmo a omissão de dados. Como, por exemplo, na divulgação de que o transmissor da febre amarela silvestre a macacos seria o mosquito Aedes aegypti o qual na realidade atua como transmissor da patologia apenas em centros urbanos das Américas.
Para ela, tais fatos aliados a intensa visibilidade dada à doença devido à enormidade do número de matérias veiculadas em apenas três meses. A ausência da distinção entre a febre amarela urbana e a febre amarela Silvestre. E a maior divulgação de casos de manifestação da doença ou de morte em razão dela são o que possibilitam o processo de agendamento da doença, em que “o leitor passa a entender que a doença está prestes a chegar a sua porta.”
E mais ainda quando a matéria que veicula a informação é de capa, sob o títlulo “ Suspeita de febre amarela provoca corrida a postos no DF”. E a argumentação embora traga que a reurbanização da doença seja remota, seleciona como frase do infectologista Luiz Jacinto da Silva que “ninguém pode dizer que não agente não corre risco” , enquanto o posicionamento oficial do governo é um simples (a reurbanização da doença) “está descartado”, reflete a sanitarista.
A corrida de aproximadamente 30.000 pessoas, em um dia, aos postos de saúde do Distrito Federal, que em geral vacinam apenas 100 pessoas ao dia. É apenas um reflexo do poder da imprensa quanto à forma de divulgação dos fatos e a escolha de prioridades de como dar as notícias tanto no concernente ao estilo em que a expõe quanto na apuraçao dos dados, como também a ênfase que lhe é dada no veículo de comunicação.
A dissertação de mestrado Epidemia Midiática: um estudo sobre a construção de sentidos na cobertura da folha de São Paulo sobre a Febre Amarela, no verão 2007-2008 foi defendida na FSP, em 2011 e orientada pela professora Angela Maria Belloni Cuenca.