São Paulo (AUN - USP) - A I Semana de Jornalismo Esportivo, realizada pela EEFUSP Junior Consultoria e pela Associação Atlética Acadêmica Ruy Barbosa (ambas constituídas por alunos de graduação da Escola de Educação Física e Esporte da Universidade de São Paulo), reuniu jornalistas, professores e profissionais do meio esportivo para promover uma discussão crítica sobre a situação do jornalismo esportivo no Brasil. Foram cinco dias de palestras (de 26 a 30 de março) e dez palestrantes, entre jornalistas da ESPN, professores da EEFE, assessores de imprensa e funcionários de clubes de futebol.
As palestras foram voltadas para estudantes de jornalismo e jornalistas interessados no segmento esportivo. Por isso mesmo críticas a vícios e erros da imprensa esportiva foram recorrentes nas palestras, servindo como aviso aos futuros jornalistas. No primeiro dia de palestras Ary Rocco, professor da EEFE e doutor em Comunicação e Semiótica, falou da tendência atual das coberturas esportivas de dar mais destaque ao entretenimento, transformando o esporte em espetáculo e o atleta em semideus. Segundo Rocco, o jornalismo e a informação acabam por ficar em segundo plano.
Daniela Giuntini, da empresa de assessoria DGW Comunicação, foi a segunda palestrante e falou sobre sua experiência de trabalhar com assessoria especializada em esporte, com destaque para o tênis. Ela destacou a importância das mídias virtuais e redes sociais para a imagem do esportista. Um de seus clientes é o tenista número um do Brasil, Thomaz Bellucci, que não queria entrar nas redes sociais mas foi convencido da importância de atualizar pessoalmente seu twitter.
No dia 27 foi a vez dos jornalistas Ari Aguiar, narrador de modalidades americanas, e Júlio Gomes, comentarista e editor online, ambos da ESPN. Para Ari Aguiar, o crescimento das modalidades americanas, principalmente o futebol americano, no Brasil é relativo. Apesar do público só aumentar, ele ainda é restrito a um nicho. E esse público sabe muito sobre o esporte, por isso, o desafio do jornalista é falar para quem conhece o esporte, mas sem assustar o público menos especializado. Ele acredita que o futebol americano tem muito espaço para crescer, mas nunca vai chegar a ser um esporte popular: “A gente não vai ver um jogo entre Corinthians Steamrollers e Fluminense Imperadores no Pacaembu lotado”.
Julio Gomes falou sobre sua experiência como correspondente internacional, contou as principais diferenças que notou entre a cobertura esportiva no Brasil e países europeus (Espanha, Portugal e Inglaterra) durante os cinco anos que morou na Europa. Para ele, o jornalista deve se especializar em fundamentos e na profissionalização do esporte, ampliar seu conhecimento sobre a parte física e o corpo humano para comentar com propriedade, não como torcedor. Alguns países estão mais próximos desse ideal do que outros: “Falta muito no Brasil, falta muito na Espanha e um pouco menos na Inglaterra.”
No terceiro dia mais críticas à falta de informação da imprensa esportiva: Júlio Serrão, professor da EEFE, falou sobre os mitos que a imprensa ajuda a difundir, e como eles podem atrapalhar não só os atletas como também a qualidade de vida do público que acredita neles. Criador da estratégia de marketing digital dos atletas Neymar e Lucas, Dayyán Morandi destacou a mudança da relação entre atleta, público e imprensa. "Nós tentamos quebrar o paradigma de que o atleta precisa da imprensa. É exatamente o contrário.”
Psicóloga, pesquisadora e professora da EEFE, Katia Rubio, que estuda principalmente sobre atletas olímpicos, falou sobre o ídolo esportivo e como muitas vezes ele ultrapassa a condição de atleta e passa a ser celebridade, até mais do que isso: o atleta tem um papel de herói nacional. "Representa o limiar entre o divino e o humano". O atleta vencedor passa uma mensagem: "O esporte identifica o Brasil como um país com algum sucesso.”
Um assunto polêmico abordado em sua palestra foi o doping: “O controle está sempre dez anos atrás da substância”. Para a professora, o Brasil está muito atrasado na discussão sobre o doping e a imprensa esportiva não ajuda, porque condena prontamente aqueles que são acusados de doping. Sobre o caso de doping do medalhista olímpico Cesar Cielo, Katia critica veementemente a imprensa. “Julgar é fácil, mas é tarefa para poucos.”
Em outra palestra do terceiro dia o tema foi a formação de futebolistas brasileiros e a “crise” em que o futebol brasileiro se encontra. Carlos Thiengo, analista de desempenho das categorias de base do São Paulo Futebol Clube, apontou que hoje existe dificuldade na formação de craques, que antes acontecia tão naturalmente no Brasil. Ele acredita que a diferença do craque é a capacidade de tomar uma decisão rápida e fazer o inesperado. Essa capacidade de decisão pode ser aprendida e é nisso que Thiengo acredita que a formação de jogadores tem que se basear. Segundo Thiengo, hoje a mentalidade dominante é a de que o que faz o craque é o dom.
No último dia, o jornalista Juca Kfouri e o professor Waldenyr Caldas, da Escola de Comunicações e Artes da USP (ECA), participaram de uma mesa redonda, mediada pelo professor Ary Rocco (palestrante da segunda-feira). Na mesa redonda os participantes opinaram sobre assuntos que tinham sido discutidos nos dias anteriores de palestras. Waldenyr Caldas destacou a mercantilização do futebol e admitiu que ela é irreversível. Juca falou sobre a recente mudança de direção na CBF: "A única diferença do José Maria Marin para o Ricardo Teixeira é que ele não tem o mesmo respaldo político. A questão da CBF é estrutural, de democratização, que precisa acontecer logo". A mesa redonda encerrou a Semana de Jornalismo.