São Paulo (AUN - USP) - Existe uma tendência mundial de centralização do poder para tomada de decisões ao enfrentarmos crises, sejam elas políticas ou econômicas. Mas essa não é a maneira mais apropriada para lidar com essa situação, segundo o professor Khai Lehmann em sua pesquisa Processos políticos complexos – auto-organização como uma maneira de lidar com incertezas e mudanças nas políticas internacionais. As crises, na verdade, não são rupturas, mas expressão de padrões específicos em um determinado tempo, um resultado da interação de vários agentes semiautônomos em vários níveis.
Lehmann explica: “Não podemos aplicar as mesmas políticas sem adaptação e sem flexibilidade em todos os lugares, é importante descentralizar os processos políticos.” Atualmente, quando enfrentamos problemas políticos, tendemos a recorrer a soluções que podem ser aplicadas em qualquer situação, do que o professor discorda: “Um processo complexo acaba com isso. Nós temos objetivos gerais, mas como esses objetivos serão alcançados e como podem ser aplicados especificamente depende das circunstâncias locais.” Assim, os principais atores do processo político seriam aqueles próximos ao problema, e o governo somente facilitaria o processo. “A instalação de UPPs no Rio de Janeiro é um exemplo perfeito de uma política inspirada em sistemas complexos.” afirma Lehmann.“O governo está construindo um contexto estável para que regras possam ser instaladas e respeitadas por todos, mas, além disso, faz muito pouco. Depende da população dizer o que a gente vai fazer com essa estabilidade.”A pesquisa propõe uma reconsideração do papel do governo em sua resolução. O desafio é transformar a visão da população como consumidora passiva das políticas do centro de poder.
A democracia em si seria um sistema complexo perfeito, que permitiria, num caso ideal, que as políticas fossem modificadas de acordo com as necessidades da população. Lehmann, no entanto, relata que as políticas externas geralmente são encaradas como um campo à parte. Portanto o maior desafio seria mostrar que, aplicando conceitos já utilizados nas democracias, nos processos de desenvolvimento econômico e nas políticas externas, seria possível diminuir os problemas que enfrentamos atualmente.
Para Lehmann, a crise econômica financeira que atravessamos está relacionada a essa falta de flexibilização, uma vez que o modelo de capitalismo de mercado foi aplicado sem levar em consideração particularidades históricas, culturais, de estruturas sociais e políticas, que devem ser respeitadas. Ele explica: “O problema na crise é que se achava que um modelo serviria para tudo e poderia, sem regras, autofiscalizar a indústria financeira. Isso não funciona em todos os casos o tempo todo”.
Contudo, ele ressalta a importância de regras, mesmo em um processo decisório mais flexível, em que governo deve ser um facilitador constante e permanente, fazendo com que as regras se apliquem a todos. “A Coréia do Norte tem regras em excesso, não tem nenhuma flexibilidade, então funciona por alguns anos, mas depois falta essa flexibilidade necessária para a inovação, responder a mudanças, responder a demandas diferentes. No outro extremo, você teria um país como a Somália, onde não existe um quadro de regras. A chave é achar um equilíbrio entre flexibilidade e estabilidade.”