São Paulo (AUN - USP) - No início do ano passado, aconteceram as primeiras liberações de machos transgênicos do mosquito da dengue (Aedes aegypti), em alguns bairros das cidades de Juazeiro (BA) e Petrolina (PE). Recentemente, pouco mais de um ano depois, os primeiros resultados de supressão das populações do mosquito foram encontrados.
O feito é do PAT – Programa Aedes Transgênico. Segundo Margareth Capurro, do Departamento de Parasitologia do Instituto de Ciências Biomédicas (ICB) da Universidade de São Paulo (USP) e pesquisadora do projeto, o processo de supressão de populações do mosquito da dengue é possível, pois podemos encontrar o mesmo vírus no mundo inteiro. É um caso diferente da malária, por exemplo, cujos antígenos da superfície lipídica do parasita são extremamente variados, dificultando a criação de uma vacina específica contra o protozoário que causa a doença.
Capurro explica que o controle biológico da dengue, desenvolvido pelo PAT, é baseado na produção de moléculas efetoras que causarão a morte do organismo.
Quando uma célula está infectada pelo vírus Aedes Aegypti, o seu genoma, que é uma molécula de RNA, é transcrito e produz uma poliproteína. Essa poliproteína será intercalada no retículo endoplasmático da célula e produzirá a molécula constitutiva da partícula viral (capsídeo). A alteração do PAT nesse ciclo acontece com a inserção de um fragmento genético na poliproteína que, ao ser processado pelo retículo endoplasmático, produzirá o ativador de apoptose da célula. “Sendo assim, uma célula infectada irá provocar o seu suicídio e morrerá. Com a contínua morte celular, nós teremos a morte do mosquito da dengue”, explica a pesquisadora.
Para que esse processo ocorra, o PAT precisou criar mosquitos da dengue geneticamente modificados, capazes de transferir esse genoma alterado para a sua prole. A essa linhagem foi dado o nome de RIDL OX513A. Após a produção, em laboratório, os machos são liberados para a natureza e as fêmeas são eliminadas. Os machos RIDL, além de não picarem os seres humanos, quando copulam com fêmeas selvagens passam o gene mortal, e os mosquitos gerados morrem ainda na fase de larva ou pupa.
Através de diversas ovitrampas (armadilhas) espalhadas pelos bairros de Juazeiro, o PAT pôde realizar o monitoramento e a análise da redução populacional do mosquito da dengue. Recentemente, o projeto atingiu um nível de redução da espécie que qualifica a sua população como suprimida, dentro dos bairros em experimentação, e isso caracteriza o sucesso da pesquisa.
Nordeste: o local ideal para o experimento
Juazeiro e Petrolina possuem altos índices de presença do mosquito da dengue. A grande quantidade de caixas d'água presentes em quintais e a ausência de responsabilidade ou limpeza delas torna as casas das cidades grandes criatórios de mosquitos. O fator decisivo para serem escolhidas, entretanto, é o fato de serem rodeadas pelo sertão. Segundo Capurro, como o mosquito não consegue sobreviver na caatinga, devido à média de 40ºC e ao indicador de 6% de umidade do ar, as cidades tornam-se verdadeiras ilhas experimentais para o PAT.
O PAT surgiu de uma colaboração entre pesquisadores da USP, a Oxitec e a Moscamed, biofábrica localizada no Vale do São Francisco, especializada no lançamento de espécies estéreis na natureza. O projeto tem ainda o apoio do Governo do Estado da Bahia, por meio da Secretaria Estadual de Saúde (Sesab) e da Secretaria de Ciência, Tecnologia e Inovação (Secti).