São Paulo (AUN - USP) - - Com o início da Rio +20, as discussões sobre a eficácia dos métodos adotados para combater a mudança climática estão entre os assuntos mais comentados. Também têm ganhado atenção os cientistas céticos, que não acreditam no Aquecimento Global. Mas a maior parte da comunidade científica permanece alinhada ao IPCC, dando pouco crédito aos trabalhos dos céticos. Já publicamos aqui (http://www.usp.br/aun/antigo/www/_reeng/materia.php?cod_materia=1205155) uma reportagem expondo as ideias de Ricardo Felício, formado em Ciências Atmosféricas pelo IAG e doutor em Geografia Física pela Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da USP e conhecido cético quanto às teorias do Aquecimento Global. Mostramos, agora, o que os cientistas alinhados com o IPCC têm a dizer sobre o assunto.
"Não dá para negar que o clima está mais quente", diz o professor Tércio Ambrizzi, Coordenador do Grupo de Estudos do Clima (GrEC), no Instituto de Astronomia, Geofísica e Ciências Atmosféricas (IAG) da USP. O pesquisador ainda afirma que, nos últimos 800 mil anos, as concentrações de CO2 na atmosfera estiveram estáveis. "Se você comparar com os últimos 100 anos, você tem um aumento de 40%". Ambrizzi aponta o aumento do CO2 nos últimos 20 anos em "1% ou 1% ao ano", embora admita a separação entre a influência antrópica e a variabilidade natural seja difícil. Ele afirma que a baixa concentração natural dos gases do Efeito Estufa na atmosfera amplia o impacto de qualquer emissão humana. "Se uma coisa é pequena, qualquer coisa que você acrescentar torna-se grande", explica.
Felício atribui o aumento da temperatura terrestre a um ciclo natural de variação da radiação solar. Ele também afirma que as moléculas de CO2, ao absorverem os raios do sol, colidem com as de outros gases mais abundantes e lhes transferem parte da energia adquirida. O restante dessa energia seria refletido em várias direções, sendo a superfície terrestre apenas uma delas. No entanto, segundo Maria Assunção Faus da Silva Dias, doutora em Ciências Atmosféricas pela universidade do Estado do Colorado, nos EUA, o processo de absorção de radiação infravermelha pelo CO2 é levado em consideração pelos relatórios do IPCC, do qual ela faz parte, indicando um aumento da temperatura terrestre devido aos gases do Efeito Estufa.
O fato de as duas últimas Eras Glaciais se terem dado em momentos de grande concentração de gás carbônico na atmosfera também é usado por Felício para questionar o suposto papel da substância no Aquecimento Global. Entretanto, Maria de Fátima Andrade, professora do Departamento de Ciências Atmosféricas do IAG, chama atenção à magnitude das mudanças trazidas por uma Era Glacial. "Esse é um exemplo extremo", diz. Já os impactos do dióxido de carbono são da ordem de "um grau ou dois". O professor Ambrizzi considera, também, inadequado utilizar essas variações extremas para contrapor a fenômenos recentes. “Eles se esquecem de dizer que todas essas mudanças se deram em milhares de anos e tiveram uma relação com constantes externas, como a inclinação da Terra e a distância Terra-Sol.”
A camada de ozônio é outro ponto polêmico, em que Felício aponta a alta instabilidade do gás e afirma que variações em sua concentração são naturais. Ambrizzi reconhece a variabilidade natural do ozônio e admite que não temos dados suficientes para determinar ao certo o quanto o atual buraco na camada se deve à natureza. Ainda assim, ele reitera o papel dos CFCs na destruição do ozônio, apontado já pelo nobel em física Mario Molina. Para Ambrizzi, não importa se não se sabe o impacto exato dos CFCs sobre o ozônio. Sabe-se que esse impacto existe e, por isso, devemos controlar as emissões.
Outra grande objeção de Felício às teorias do Aquecimento Global diz respeito a uma suposta falta de evidências, sendo as descobertas dos cientistas baseadas em modelos numéricos no computador, cuja precisão ele questiona. Mas, segundo Maria Assunção, os efeitos do CO2 já foram demonstrados, sim, por experimentos em laboratório. Segundo a pesquisadora, os modelos são aplicados apenas nas previsões de desdobramentos a longo prazo. E, ainda assim, afirma que essas simulações virtuais são confiáveis. "Para você ter um modelo escolhido para fazer a análise do futuro, ele tem que mostrar que faz um trabalho razoável no presente".
Felício desacredita igualmente os dados disponíveis de medição de CO2, vindos, em grande parte, da estação de Mauna Loa, no Havaí. Ele afirma que essas medições estariam contaminadas pelas emissões do vulcão homônimo, localizado nas proximidades. Porém, Maria Assunção afirma que, se essa contaminação realmente existisse, "seria episódica" e "teria sido apontada pelos inúmeros cientistas que trabalham com esses dados.”
Felício questiona o próprio procedimento de medição do CO2, o chamado método de Petenkofer. Segundo ele, os climatologistas atuais teriam declarado esse método obsoleto, mas continuado a usá-lo hoje em dia. Maria de Fátima Andrade, porém, afirma que diferentes métodos de medida (diretos e aproximados) são utilizados nessas avaliações. Segundo a cientista, o mais importante é que as tendências de aumento são observadas" na quantidade dos gases a longo prazo. Ela afirma que as diferentes metodologias se diluem ao se observarem essas tendências.
Maria de Fátima responde, também, à alegação de Felício de que haveria erros no uso feito pelo cientista sueco Svante August Arrhenius, no século 19, para calcular a influência do Efeito Estufa. Segundo ela, o trabalho de Arrhenius já não é tão relevante. "Não estamos discutindo os resultados dos químicos mais antigos, que, por vezes, não consideraram todas as variáveis", contrapõe. "Estamos discutindo resultados mais modernos, que são a somatória de avanços em diferentes áreas. E, apesar de abordagens mais simples ou mais complexas, há coerência na previsão de aumento de temperatura da Terra associado com o aumento dos gases do efeito estufa."