São Paulo (AUN - USP) - Em um trabalho conjunto com outros pesquisadores e profissionais de diferentes ramos relacionados à temática da segurança contra incêndio, o professor Valdir Pignatta e Silva tem sido o responsável por reunir material acerca das estruturas que se inserem nessa complexa rede de estudos sobre o assunto. Especialista em segurança das estruturas em situação de incêndio, o professor do Departamento de Engenharia de Estruturas e Geotécnica da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo (Poli) relata os desafios de se estudar um campo do conhecimento que é pouco valorizado no país, apesar de sua importância para a proteção à vida humana.
Segundo Pignatta, é possível afirmar que o tema começou a chamar a atenção, no Brasil, principalmente depois do incidente ocorrido no Edifício Joelma, em São Paulo, no ano de 1974, quando ocupantes do prédio começaram a se jogar pelas janelas após o início de um incêndio que tomou conta da grande maioria dos pavimentos. Hoje, conhecimentos básicos no assunto ensinam que erros desencadeadores de incêndios podem ser minimizados caso se evite a propagação do fogo. Daí a necessidade dos andares serem compartimentados, o que, na opinião do professor, ressalta a importância das portas corta fogo (que evitam que o incêndio se alastre de um andar para o outro). O mesmo podendo ser considerado a respeito do papel das paredes, lajes, parapeitos nas janelas e da vedação de tubulações entre andares.
Mas, além de problemas simples, muitos outros desafios têm sido lançados para o setor como, por exemplo, a capacitação de profissionais para trabalhar na área e a indiferença com a legislação que regulamenta as construções. No Brasil, as leis de segurança contra incêndio são estaduais, sendo que a algumas delas não atendem às reais necessidades de segurança da população. No estado de São Paulo, no entanto, “a legislação é mais robusta e acaba inspirando o texto da lei de outros estados”.
Na região, bombeiros estão habilitados a realizar a análise de projetos de edificação, a fim de verificar se as construções estão aptas a serem ocupadas. E mesmo que possa ser discutível que esses profissionais tenham preparo para fazê-lo, o mesmo pode-se dizer sobre grande parte dos engenheiros que assinam os projetos. “Falta conhecimento sobre o assunto. Em 2010, foi incluída uma disciplina optativa sobre o tema na grade da engenharia civil da Poli, mas, no exterior, chega a existir graduação específica nessa área”. Ainda que tenha havido aumento na procura pelo setor, Pignatta lamenta que a maioria de seus orientandos não exerçam atividades relacionadas a estruturas em situação de incêndio. “Como o mercado não valoriza esse tipo de profissional, muitos deles vão procurar emprego em outras áreas.”
Sobre os estudos em si, o professor revela que “se o projeto for feito adequadamente, todos os materiais têm condições de resistir da mesma forma. Nossas pesquisas são baseadas em modelos matemáticos, que procuram apenas representar a realidade”. A partir disso, Pignatta visa explicitar a necessidade de se fazer estudos cuidadosos a respeito dos materiais usados nas construções, uma vez que esse é o caminho mais seguro para tratar de riscos e lidar com o imponderável.
As situações de um incêndio são específicas de cada caso, sendo complexo delimitar variáveis como a quantidade de material inflamável no interior de um prédio, o tempo que o fogo pode demorar para se alastrar e o comportamento das pessoas, por exemplo. Por isso, apesar do fato de que, atualmente, é exigido por lei que os pavimentos sejam compartimentados, ainda se atenta ao risco de que os incêndios são mais preocupantes quanto mais altos forem os prédios. “Trabalhamos com modelos e existe o risco de o modelo estar errado. Risco é o perigo com consequências”. Assim, não se pode considerar que o efeito de um incêndio em um prédio térreo ou no 30° andar de um edifício seja igual, porque existe aí um perigo e, se algo der errado, as consequências serão mais graves no prédio com maior número de andares.
Embora o campo numérico computacional faça parte do cotidiano dos estudos referentes ao tema, o pesquisador não descarta a importância de análises experimentais. Em parceria com a USP de São Carlos e com a Unicamp, ele tem participado do projeto de desenvolvimento de um forno horizontal, cujo objetivo é proporcionar a medição do comportamento de determinados materiais sujeitos a uma gradual elevação de temperatura. “Até o momento, o único laboratório montado para atender as exigências legais [determinadas pela Associação Brasileira de Normas Técnicas] fica no IPT (Instituto de Pesquisas Tecnológicas), e é necessário enfrentar longas filas para o agendamento de testes”. Para o professor, a falta de interesse pelo tema é cultural, visto que, no Brasil, ainda é muito comum que as pessoas não se preocupem com a própria proteção às suas vidas.