São Paulo (AUN - USP) - Um projeto de pesquisa desenvolvido no departamento de parasitologia do Instituto de Ciências Biomédicas (ICB) e coordenado pelo professor Alejandro Miguel Katzin busca identificar potenciais alvos para a quimioterapia da malária. Os alvos estudados são específicos do Plasmodium, protozoário parasita da doença. Katzin conta que para se desenvolver um quimioterápico é preciso usar uma droga ou uma combinação de drogas que ajam em diferentes pontos de uma mesma via metabólica. “Nós estudamos a via de isoprenóides, estamos tentando inibir vários pontos dela para que não exista uma via de salvação, que é um ‘caminho alternativo’ que o parasita tenta”, explica.
A via de isoprenóides – no homem, tem diversas funções, uma delas é biossíntese do colesterol –, foi escolhida para ser pesquisada, depois de alguns estudos que mostraram que essa via no parasita é muito semelhante com a das plantas e diferente da dos mamíferos. A hipótese é de que durante a evolução, oPlasmodium incorporou algumas vias metabólicas de algas.
A via de isoprenóides tem vários produtos finais e o objetivo é investigar todos para ver se eles são sintetizados nos parasitas assim como são nas plantas. “Analisamos um por um, e com isso estudamos quais são os intermediários dessa via metabólica e como eles se formam. Tentamos identificar as enzimas envolvidas nesse mecanismo e com isso, potenciais inibidores”, conta Katzin. Quando se usa um inibidor, o fluxo da via metabólica é interrompido e o produto não se forma. Se o parasita não encontrar uma via de salvação e o produto for importante para o metabolismo, ele não sobrevive. Como a via de isoprenóides do Plasmodium é diferente da do homem, a inibição do produto só afeta o parasita. Não reage no hospedeiro porque o homem não sintetiza esses produtos. No desenvolvimento de uma droga, “isso implica em muito menos efeitos colaterais, ou até mesmo, nenhum”, explica o professor.
Como o parasita se desenvolve em hemácias humanas, o estudo é feito em uma cultura dessas células. O primeiro objetivo da pesquisa é descobrir se o parasita produz um metabolito que o homem não sintetiza e depois, encontrar uma forma de inibi-lo. Os intermediários e produtos de uma via metabólica são estudados por marcação metabólica com precursores radioativos geralmente marcados com carbono -14 e identificados por métodos cromatográficos que separam esses metabolitos. “Depois de identificar os metabolitos sintetizados pelo parasita, pesquisamos se os genes correspondentes às enzimas envolvidas para a síntese de cada um desses produtos estão presentes nos parasitas. Com isso, temos certeza que as vias metabólicas existem”, explica Katzin.
Como existem diversos produtos na via de isoprenóides e vários pontos da via tem que ser estudados, o processo de pesquisa é demorado. No entanto, já foram feitas algumas descobertas. Já se concluiu que o parasita sintetiza vitamina K e E, além de carotenos, importantes antioxidantes. O homem não sintetiza nenhum desses três produtos, os obtém somente através da alimentação. Portanto, são alvos potenciais para o desenvolvimento de drogas antimaláricas.
As conclusões da pesquisa foram publicadas em trabalhos científicos, e são uma forma de difundir resultados. Essa divulgação é importante porque Alejandro Katzin e sua equipe só sugerem alvos em potencial, eles não tem condições e nem formação para desenvolver drogas antimaláricas. Isso cabe a institutos e laboratórios mais especializados que devem aprofundar os estudos, mas, segundo Katzin, há falta de interesse dos laboratórios nesse tipo de pesquisa. Isso porque os resultados são preliminares e os investimentos teriam que ser muito altos. Além disso, a malária é uma doença considerada negligenciada, pois está mais presente em países pobres e o lucro que se pode obter dela é baixo. No entanto, o pesquisador acredita que um laboratório possa se interessar e investir nisso ou que nos estudos pode se encontrar antimaláricos de baixo custo.
Para Katzin, só drogas antimaláricas não bastam para combater a doença. “O ideal seria ter uma vacina, drogas e combater o mosquito. Se a gente faz uma campanha mundial de tratamento de todos os indivíduos com malária e uma campanha sistemática, não haveria mais infectados”, conta. Segundo ele, a malária é uma doença potencialmente erradicável, “hoje, com o conhecimento que a gente tem, deveria ser uma doença histórica”, afirma. Porém, as políticas públicas adotadas são para tratar a malária, já que a curto prazo, controlar e erradicar a doença é mais caro.