São Paulo (AUN - USP) - Desde o descobrimento das propriedades do pau-brasil, o extrativismo vegetal desenfreado vem sendo uma constante em nosso país. Porém, ao longo do último século, a devastação intensificou-se, pondo em risco a existência de diversas espécies vegetais.
Para tentar reverter esta tendência, o laboratório de Biologia Celular de Plantas do Instituto de Biociências (IB) da Universidade de São Paulo (USP), sob os cuidados dos professores Eny Iochevet Segal Floh e Walter Handro e financiado pelo CNPq e pela FAPESP, vem aplicando uma técnica de reprodução que permite clonar ostensivamente embriões de uma mesma semente-modelo, conhecida como embriogêse somática.
Após coletar sementes em campo, os pesquisadores extraem seu embrião naturalmente fecundado (zigótico) e o acondicionam num meio de cultura próprio, com substâncias reguladoras de crescimento que induzirão a formação de um número indefinido de embriões produzidos em laboratório (somáticos) a partir do primeiro. Os novos embriões são então retirados do meio de cultura e acondicionados em outro meio, onde terminam sua formação. Ao final do processo, podem ser utilizados como sementes sintéticas (artificiais) ou germinar normalmente e tornar-se plântulas, que podem ser facilmente replantadas.
Essa técnica é especialmente eficaz para espécies que possuem sementes com alto teor de água e por isso não podem ser armazenadas por longos períodos de tempo. Livre das restrições impostas pela natureza, os pesquisadores podem gerar novas plantas em grande quantidade o ano todo, não apenas no período natural de reprodução dos vegetais.
Espécies nativas
A Mata Atlântica, berço do pau-brasil, é um dos ecossistemas que mais foi agredido em nosso país, restando aproximadamente 7% de sua cobertura original. A pesquisadora Claudete Santa-Catarina desenvolve sua pesquisa tentando reverter esse quadro, utilizando a embriogênese somática numa das árvores mais altas da mata, a Ocotea catharinensis, popularmente conhecida como canela preta.
Alcançando em média 30m de altura, a Ocotea foi amplamente explorada entre as décadas de 40 e 70 devido à alta qualidade de sua madeira e o grande diâmetro de seu tronco, encontrando-se hoje em risco de extinção. Contribuem também para esse processo a lenta reprodução do vegetal e a falta de programas oficiais de reflorestamento.
Em situação um pouco pior encontra-se a araucária, Araucaria angustifólia. A árvore imponente alcança até 50m e já ocupou 20 milhões de hectares de florestas nos estados da Região Sul, em São Paulo, Minas Gerais e no leste da Argentina. Hoje, porém, encontra-se restrita a 1% ou 2% do território original.
Responsável pela aplicação da embriogênese somática na araucária, o pesquisador da USP e professor da Universidade Federal de Goiás, Vanildo Silveira, colheu bons frutos ao utilizar a análise proteômica. A técnica tem como objetivo identificar proteínas expressas diferencialmente, ou seja, que estão presentes em vários estágios do desenvolvimento da planta.
Vanildo identificou assim três novas proteínas no embrião zigótico (modelo genético) da araucária. Duas delas são proteínas de reserva, fontes de aminoácidos para o vegetal, e a terceira é do tipo LEA (marcadora de desenvolvimento). Encontrada no embrião zigótico maduro, o conhecimento dessa proteína possibilita um controle de qualidade maior sobre o crescimento e a maturação dos embriões somáticos (criados in vitro).
O objetivo principal de todas essas técnicas e pesquisas é impedir a extinção e promover o reflorestamento dessas espécies vegetais. Os pesquisadores esperam que elas possam readquirir sua antiga imponência na flora brasileira por meio de reprodução em larga escala e do alto valor genético agregado às suas futuras gerações.