A discussão dos conceito filosóficos de “ética” e “sociabilidade” e a aplicação prática desses na realidade de um campus foram o principal objetivo de uma mesa-redonda realizada pela Comissão de Ética e o Instituto de Estudos Avançados da Universidade de São Paulo (IEA/USP). A palestra, realizada no último dia 10, foi o terceiro encontro do ciclo Ética e Universidade, iniciado em 2012.
Os convidados foram os professores Cícero Araújo, do Departamento de Ciência Política da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras (FFLCH/USP); Leopoldo Waizbort, do Departamento de Sociologia da FFLCH; Yves De La Taille, do Instituto de Psicologia (IP/USP); e Sérgio Adorno, diretor da FFLCH e coordenador científico do Núcleo de Estudos da Violência.
Discussões sobre o passado e o presente da universidade no mundo ocidental, questões de autonomia intelectual das instituições e a última ocupação da reitoria da USP por estudantes foram temas levantados na mesa-redonda. “A Instituição de Ensino Superior (IES) atual é diferente da universidade dos dois últimos séculos e é preciso entendê-la para se compreender as relações interpessoais dentro desse ambiente”, disse Waizbort. “Se a universidade do passado (séc. 19) e a moderna ( séc. 20) tinham, respectivamente, as funções de formar e especializar os indivíduos, a IES apenas confere um diploma”, explicou. “Isso é análogo ao grau de ‘liquidez’ que os relacionamentos humanos vêm sofrendo com o decorrer do tempo e da acentuação do sistema econômico.”
Cícero Araújo concorda com Waizbort, dizendo que “sociedade e universidade são feitas do mesmo ‘barro’, entretanto esta precisa se distanciar daquela para que a autonomia intelectual seja possível”. Para ele, a USP, ou qualquer outra universidade, deveria ser o lugar, teoricamente, em que a ética melhor se expressaria. “Se espera que a democracia e a república, por exemplo, funcionem melhor dentro de um campus, mas não é o que acontece. Temos de preservar nossa autonomia para que possamos ser um bom exemplo para o restante da sociedade”.
“Não há mais a figura do professor como um ‘mestre’ a ser seguido. O corpo discente e o docente são bastante distantes. Com isso, a sociabilização primária é perdida” analisou Adorno. “Como a sociabilidade é bastante precária, a ética também é afetada no meio universitário. A autoridade é um conceito que se perde, fazendo com que o desrespeito possa se tornar constante nas relações pessoais”, falou. “O exemplo máximo disso foi a violência utilizada nos meios da ocupação da reitoria da USP. ‘Violência’ e ‘ética’ são termos auto-excludentes. Ou se tem um, ou outro.”
Para Yves De La Taille, o que explica esse distanciamento entre as pessoas no meio universitário e a prevelecimento da IES à estrutura da universidade pós-moderna são a “fúria normatizadora”, ou seja, uma certa necessidade de se regulamentar as ações das pessoas nesse espaço, e a fragmentação da ética, fazendo com que haja vários códigos de normas, dando a ideia de que a ética é relativa.“No entanto, devia ser a mesma ética”, questionou. A dificuldade de se ter espaço interdisciplinares e generalistas, o que acirra a especialização, e a confusão entre os conceitos “excelência/meritocracia” e “competição/vaidade” também dificultam a convivência nos campido mundo ocidental, da acordo com De La Taille.