Está em curso, no Laboratório de Desenvolvimento de Vacinas (LDV) da USP, uma pesquisa para uma nova vacina contra o HPV. A diferença em relação às vacinas já existentes no mercado é que esta não tem por objetivo prevenir a infecção. “A vacina que estamos desenvolvendo em nosso laboratório tem como objetivo controlar ou regredir lesões e tumores estabelecidos, ou seja, apresenta caráter terapêutico”, conta a pesquisadora Mariana Diniz. Ela ainda completa que “as evidências sugerem que a combinação dessas imunoterapias com quimioterapia, ou estratégias que revertam mecanismos de escape imunológico ou imunosupressão, podem ser chaves para o sucesso dessas vacinas, principalmente em pessoas com grau avançado de tumor”.
Os testes da vacina já começaram e “em modelo animal, esta vacina tem demonstrado conferir total proteção antitumoral terapêutica em camundongos que previamente recebem células tumorais que apresentam essas oncoproteínas de HPV”, afirma Mariana. Ela também avalia que os frutos gerados até agora demonstram que a estratégia dessa vacina teve resultados superiores a de outras com mesmo modelo e “esforços estão sendo realizados no sentido de realizar os ensaios pré-clínicos de segurança dessa vacina, e, futuramente, avaliá-la em ensaios clínicos”.
Tipos e variantes
Com pesquisas relacionadas ao HPV, no dia 10 de abril, a pesquisadora Laura Sichero, do Icesp (Instituto do Câncer de São Paulo), palestrou sobre “Diversidade genética e funcional do HPV” no Instituto de Ciências Biomédicas (ICB). A pesquisadora falou sobre as linhas de pesquisa do Instituto, os tipos de HPV e sua pesquisa.
Entre as quatro linhas de pesquisa do Icesp, Laura Sichero trabalha com a de “variabilidade genética e fatores de transcrição”. Nesse linha, ela, juntamente com outros pesquisadores, pesquisa os tipos de HPV, suas variantes e a ação de proteínas em determinadas partes do vírus. Segundo Laura, existem mais de 150 tipos de HPV, sendo que alguns são de baixo risco oncogênico, ou seja, baixo risco de causar câncer, e outros são de alto risco. No último grupo, destacam-se o HPV16 e o HPV18. De acordo com a professora do Departamento de Imunologia do ICB, Ana Lepique, eles são mais frequentes em tumores pois as células infectadas por esses vírus têm maior tendência à imortalização e transformação celular, quando comparadas às infectadas por outros tipos de HPV. As células infectadas por esses vírus também são mais eficientes para escapar das respostas imunológicas do hospedeiro.
Os tipos mais comuns no mundo são o o HPV6 e o HPV11, HPV16, o HPV18, sendo os dois primeiros de baixo risco. O tipo 16 é o mais prevalente em quase todas as regiões do mundo, é o mais comum em pessoas portadores de HPV com tumor e também sem tumor. A pesquisa de Laura Sichero também revelou que as variantes do HPV não europeias (asiático-americana e africana) são as com maiores índices de persistência de infecção e de maior risco de desenvolvimento de lesão, sendo assim há maiores chances de desenvolvimento de carcinoma (tumor maligno).
Números da epidemia, ações do vírus e prevenção
Cerca de 50% dos homens e 20% das mulheres são portadores do vírus HPV no mundo, segundo estudo publicado na revista científica Lancet. O HPV, Papilomavírus humano, é o nome dado a um grupo de vírus que infecta pele ou mucosas. É considerado uma DST (doença sexualmente transmissível), sendo que o simples contato das áreas genitais já pode transmitir o vírus. Apesar da grande maioria das infecções acontecerem por via sexual, o vírus também pode ser propagado através de objetos (em menor proporção) e da mãe para o feto durante a gestação. Atualmente, já existe no mercado uma vacina que previne novas infecções.
O HPV pode causar verrugas nas regiões oral, anal, genital e da uretra. Nos homens, devido às características de seus órgãos sexuais, é mais fácil reconhecer as lesões. Já nas mulheres, as lesões podem se espalhar por todo o trato genital e alcançar o colo do útero antes que o disgnóstico seja feito, visto que, nelas, os casos são, em sua maioria, identificados por exames especializados, como o Papanicolau. O HPV pode também ficar dormente por muito tempo e até mesmo nunca se manifestar no indivíduo. Em seus estágios iniciais, grande parte das lesões ocasionadas pelo vírus podem regredir espontaneamente ou por meio de tratamentos. Estes podem ser por intermédio de medicamentos ou cirurgias, como a cauterização química, a eletrocauterização, a crioterapia e a cirurgia à laser. A camisinha é uma boa forma de prevenção, contudo não é 100% eficiente, uma vez que não é necessário penetração para a transmissão e, muitas vezes, as pessoas só utilizam a camisinha neste momento.
Em algumas ocorrências, o vírus pode evoluir e causar câncer de útero e pênis, sendo o primeiro o mais frequente. Estudos do Portal da Saúde do SUS (Sistema Único de Saúde do Governo Federal) estimam que 90% dos casos de câncer de útero são provocados pelo HPV. “Como em qualquer outro tipo de câncer, a melhor coisa a se fazer é prevenção. No caso do HPV, as mulheres devem fazer exames como Papanicolau com frequência, a fim de detectar lesões precursoras do câncer. No caso de tumores em outros sítios anatômicos como vagina, vulva, ânus e orofaringe, exames preventivos também podem ser feitos. Uma vez detectada uma lesão pré-tumoral ou tumoral, ela pode ser retirada por procedimentos cirúrgicos como cirurgia de alta frequência”, conta a professora Ana Lepique.
Vacina disponível no mercado
Em comercialização, existem dois tipos de vacinas para o HPV. A Bivalente (Cervarix), do laboratório GSK, que protege contra os tipos 16 e 18 do vírus e a Quadrivalente (Gardasil), do laboratório Merck Sharp & Dhome, que imuniza contra os tipos 6, 11, 16 e 18, respectivamente os mais comuns em verrugas genitais e câncer. São necessárias três doses da vacina para a imunização. A vacina ainda não está disponível no Sistema Único de Sáude (SUS), deve entrar no calendário em 2013 (de acordo com a PL 6820/10, do Senado, aprovada em 20 de março deste ano) e cada dose custa em torno de R$ 350. Segundo o relator, deputado Geraldo Resende (PMDB-MS), cabe ao Executivo decidir a faixa etária na qual a vacina será aplicada, o importante é que ela entre logo no calendário de vacinações. Para começar a vigorar, o projeto, que tem prioridade, ainda será analisado, em caráter conclusivo, pelas comissões de Finanças e Tributação e de Constituição e Justiça e de Cidadania. No Distrito Federal já há uma campanha do gênero. Até dia 26 de abril, todas as meninas entre os 11 e 13 anos, de escolas públicas e particulares, poderão receber a primeira dose da vacina gratuitamente. As outras duas doses serão aplicadas ao longo do ano, também de forma gratuita.
Gardasil: vacina quadrivalente disponível no mercado
O Ministério da Saúde sinaliza que a vacina deve ser tomada por indivíduos ― principalmente mulheres, sendo que a permissão para homens foi aprovada somente em 2011 e estes podem tomar somente a quadrivalente ― na faixa etária de 9 a 26 anos, mas, segundo o pesquisador Enrique Boccardo, a vacina pode ser aplicada a qualquer pessoa. O ponto é que, idealmente e por se tratar de uma vacina profilática (com intuito de evitar a contaminação pelo vírus), é conveniente que seja aplicada antes da primeira exposição ao agente. No caso do HPV, antes do início da atividade sexual. No entanto, os trabalhos recentes mostram que mesmo mulheres acima de 26 anos podem se beneficiar da vacinação.
Vegetal comum no litoral brasileiro pode ser solução
Outro avanço em benefício da população foi o da pomada contra o HPV. Desenvolvida por pesquisadores da Universidade Federal de Alagoas (Ufal), a pomada foi produzida utilizando o extrato do barbatimão, vegetal comum no litoral brasileiro. A substância atua na desidratação das células infectadas, que secam, descamam e desaparecem. Durante cinco anos, 46 pacientes com HPV de diversos tipos foram acompanhados pelo Hospital Universitário da Universidade, participando de um tratamento de dois meses, no qual eles precisavam usar a pomada duas vezes ao dia. Ao fim da pesquisa, 100% dos pacientes não possuíam mais as verrugas.
Barbatimão, vegetal base da pomada produzida na Universidade Federal de Alagoas