Identificar um cadáver através de seus dentes é tão eficiente quanto realizar um exame de DNA. Essa é conclusão de um estudo realizado na Faculdade de Odontologia (FO) da USP pelos pesquisadores Alexandre Deitos, Alana Azevedo, Maria Gabriela Biazevic e Michel Crosato. A pesquisa buscou analisar a efetividade desse método mesmo com possíveis influências da melhora da condição da saúde bucal da população brasileira.
O resultado a que se chegou foi de apenas 1% de erro para a comprovação da identidade do corpo, porcentagem muito aproximada da confiabilidade de um exame de DNA mitocondrial, outra técnica utilizada nas perícias forenses. Deitos explica que a técnica que utiliza os dentes como referência acaba sendo mais vantajosa devido à rapidez e ao preço. “O método do DNA pode levar meses e é muito mais caro”, diz.
A identificação de uma pessoa a partir de seus dentes é feita através do cruzamento de dados do paciente, comparando registros sobre a dentição anterior à morte com a do corpo encontrado. Segundo Deitos, “a partir das características em comum, é possível checar a identidade do corpo”.
Segundo Maria Gabriela, a partir de dados dos levantamentos epidemiológicos realizados pelo Ministério da Saúde sobre a dentição dos adolescentes brasileiros, foi comprovado que cada pessoa tem muitas particularidades nos dentes, como cáries, próteses, restaurações, que a tornam única. Esses fatores são somados e utilizados como critérios para comparação dos corpos, durante o processo de identificação. “Isso faz com que chance de errar seja muito baixa”, explica.
Questionamentos
Já que o método leva em consideração as interferências externas e os tratamentos dentários para estabelecer os padrões dentários, o grupo de estudo questionou se a melhora das condições bucais observada nos adolescentes poderia ser reduzir a eficácia do procedimento. Deitos esclarece: “Quanto menos cáries, próteses e restaurações uma pessoa tem, mais difícil é a identificação, pois os dentes de várias pessoas passam a ser iguais”.
De 2003 para 2010, houve uma redução de 30% no número de cáries nos adolescentes. Maria Gabriela credita esse resultado à presença de flúor na água e nas pastas de dentes, além da política nacional de saúde bucal. Segundo a professora, a melhora também está associada às desigualdades sociais. “Quando elas diminuem, os indicadores de doenças melhoram”, explica.
Mesmo com os bons resultados na saúde bucal, a dentição dos adolescentes não é perfeita, o que faz com que a identificação de corpos por comparação ainda seja possível. Deitos ressalta que, caso os resultados fossem negativos, seria preciso agregar outras características “para que o método não perca sua eficácia”.
Destruição em massa
De acordo com Maria Gabriela, a comparação dentária continua sendo uma medida interessante em casos de acidentes com destruição em massa, já que os dentes resistem a situações de altas temperaturas e excesso de umidade. “Essas estruturas se preservam por mais tempo do que os outros ossos do corpo”, diz.
Além disso, a pesquisa também concluiu que os resultados são positivos mesmo com a avaliação de apenas metade da arcada dentária. Em acidentes, é comum encontrar a dentição parcial, o que indica mais um fator positivo para o método. O procedimento foi adotado com sucesso em acidentes como as quedas dos voos da TAM, em 2007, e da Air France, em 2009.