O jovem que sai da casa dos pais para morar sozinho, aos poucos, passa a reconhecer seu novo espaço e a apropriar-se dele. Conforme o psicólogo Gustavo Monteiro Pessoa de Andrade, este espaço torna-se favorável para que lhe ocorram experiências e mudanças psíquicas. A casa, assinala o psicólogo, aparece como recanto para o repouso e o esquecimento das tarefas difíceis da vida, um refúgio, em que, devido aos aspectos de proteção e segurança, “as transformações constitutivas da ‘adultez’ ocorrem”. Ele também destaca a importância que a experiência de morar sozinho tem na busca do autoconhecimento, visto que a casa é um lugar oportuno para a “elaboração dos diferentes conteúdos da poética do estar”.
As experiências de jovens que deixaram a casa dos pais e passaram a morar sozinhos na cidade de São Paulo foi o cerne da dissertação de mestrado de Gustavo, defendida em maio no Instituto de Psicologia da USP (IP/USP). O sentimento de enraizamento e desenraizamento devido a constantes mudanças de espaço, assim como a dificuldade de atribuir significado a tais espaços, foi o que motivou a pesquisa do psicólogo, que buscou abranger aspectos simbólicos daquilo o que é entendido por “mudar-se”.
De acordo com Gustavo, o espaço é uma via privilegiada para que se possa compreender a dimensão psicológica do indivíduo, neste caso, do jovem, que vive uma fase de alternância entre a maturidade e o “lançar-se no mundo mais típico do pueril”. Diante disso, na juventude, ao se ir morar sozinho, progressivamente atinge-se a “adultez”.
O pesquisador aponta que o entendimento do espaço como um “choque de trajetórias e relações que ocorrem no aqui-agora” o auxiliou, durante a pesquisa, a fixar, mais precisamente, o papel da casa e a sua relação com o mundo. Ele indica também que a cidade deve ser considerada no desenvolvimento psíquico do jovem, em cuja interioridade está presente a ideia de velocidade, de rapidez, ligada à urbanidade.
Isto pode ser observado quando se vivencia a transição da casa dos pais para outra casa, “ainda incipiente em relação à sua capacidade de habitar”. Deste modo, as questões do status, da mobilidade e da transitoriedade são trazidas à trajetória do indivíduo.
Ao realizar uma pesquisa qualitativa, em que conheceu as casas e as histórias de dez jovens, que saíram da casa dos pais e estão morando em São Paulo, Gustavo explica que, em geral, a casa do jovem apresenta-se rica em aspectos simbólicos que são opostos, complementares e contraditórios.
Conforme o psicólogo, para se estudar melhor esta questão do espaço, deve-se analisar a primeira casa do indivíduo, que é lugar de “instabilidade e proteção”, onde os pais são confrontados com a autonomia e a responsabilidade. Ele ainda ressalta a importância de se atentar às interconexões da casa com o espaço público, visto que, a seu ver, deve haver a individuação do ponto de vista coletivo.