ISSN 2359-5191

21/05/2013 - Ano: 46 - Edição Nº: 21 - Economia e Política - Instituto de Relações Internacionais
Pessoas que mudaram o país são, sim, brasileiras
Jacques Marcovitch mostra como pessoas que “deram a volta por cima” estão presentes há séculos na história do país

“São pessoas que conquistaram uma segunda vida. Não há aqui nenhuma pessoa que ainda exista: todas já encerraram sua vida e conquistaram uma outra na memória coletiva, pelo que fizeram”. É assim que o professor e ex-reitor da USP, Jacques Marcovitch, delineia a primeira característica das personalidades que integrariam a trilogia Pioneiros e Empreendedores: a saga do desenvolvimento no Brasil. Foram anos de pesquisa para selecionar 24 pessoas que sintetizassem, na integralidade do país, uma inspiração para os jovens de todas as regiões do Brasil, que agora podem conferir em exposições a história dos brasileiros que impactaram seu presente e o futuro.

Cada um dos três livros possui uma região destacada, no objetivo de fazer a ponte entre contexto histórico, social e econômico com a ação empresarial. O primeiro volume fala sobre os paulistas, com personagens como Júlio Mesquita, a família Prado e Francisco Matarazzo. O segundo abarca as regiões sul e centro-sul, citando, entre outros, o Barão de Mauá, Luiz de Queirós e Lafer-Klabin. O terceiro, finalmente, cita o Norte, o Nordeste e Minas Gerais, que é a terra de Bernardo Mascarenhas, Roberto Marinho e Edson de Queiroz.

Imagens dos 24 empreendedores do livro
Os 24 empreendedores citados no livro de Marcovitch. Fonte: pioneiroseempreendedores.com


A trilogia foi feita a partir de uma necessidade — faltam casos brasileiros nas escolas de administração, em detrimento dos já conhecidos estrangeiros, como Ford e Pirelli. Os personagens da obra seriam mitos, mas desprovidos de sacralização, já que eram pessoas imperfeitas como quaisquer donos das grandes organizações atuais. Sendo assim, a função de sua obra, longe de um mero livro sobre casos de sucesso, é mostrar referências históricas positivas de pioneiros e empreendedores nacionais.

O caminho de um empreendedor

Ele foi expulso pelo padrasto da casa da mãe depois do pai assassinado. Saiu do Rio Grande do Sul para o Rio, refugiando-se na casa de um tio. Este o deixou morar com escravos, para ser seu mensageiro. Depois, ele virou um escrituário. Passou a contador. Quando já tinha tornado-se um administrador, conheceu os ingleses (financiadores de grandes projetos no Brasil) e representou um desses escritórios. Fundou o Banco do Brasil, tornando-se um grande empresário, investidor no exterior. Perdeu tudo na vida, recompôs-se e depois faleceu na dignidade.

Essa é uma síntese da biografia do Barão de Mauá, um dos personagens citados na segunda obra da trilogia. Para Marcovitch, um ponto em comum das trajetórias descritas é a presença das adversidades (em dois terços dos casos) e da diversidade (em todos os casos).

Na maioria dos casos, os pioneiros e empreendedores são pessoas que, desde cedo, enfrentam desavenças em sua vida (como a infância de Mauá ou os frequentes casos de migração). “Lida-se com a adversidade de duas formas: ou ela é uma alavanca para uma ação construtiva ou ela pode se constituir também num sentimento de derrotismo, de refúgio e depois de marginalização. Essas pessoas lidaram com a adversidade pela via construtiva. É uma vida repleta de adversidades transformada em projetos construtivos”, ressalta Marcovitch. O outro terço é composto por pessoas que já nasceram em famílias mais abastadas, mas muito cedo foram ao encontro do “outro”. Em todos os casos, há uma aprendizagem de responder positivamente às adversidades e de possuir uma “sensibilidade transcultural”, algo que se transporta ao longo da vida dos estudados.

Além da característica de permanecer no imaginário coletivo, o professor estabeleceu como critérios o recorte regional das personalidades e o fato destas gerarem riquezas para além dos fundadores da empresa e suas famílias, gerando bem-estar para as pessoas ao seu redor. Muitos desses pioneiros integraram pioneirismo empresarial, cultural e social — como, por exemplo, os hospitais judaicos em São Paulo.

Projeto educativo-pedagógico

Com o fim da trilogia, em 2007, começa o processo de musealização. Ele se materializa no Rio de Janeiro em setembro de 2010 e começa a haver um interesse pela itinerância, isto é, a exposição começa a variar de acordo com o lugar em que ela ocorre. “O que nós temos é um trabalho de mergulho nos pioneiros locais. Então, existe uma parte constante e uma parte que leva em conta as especificidades de cada região”.

Como exemplos, Marcovitch ressalta dois casos. O primeiro é o da própria exposição inaugural, que ocorreu em uma favela do Rio. Depois da exposição em si, os alunos da escola pública visitante puderam conviver com os personagens e montar um projeto pioneiro próprio, pensando nos eventos da Copa do Mundo e das Olimpíadas no Brasil, que só ocorreriam muito depois. “Nos museus dentro das favelas, há hoje uma recuperação da história da favela. São uma forma de pacificação, quero dizer, são uma forma de dar uma identidade para essa comunidade, para que eles apareçam com notícias positivas e não só na página policial”.


Exposição inaugural no Rio de Janeiro sobre os pioneiros e empreendedores. Fonte: tour virtual no site
Exposição inaugural no Rio de Janeiro sobre os pioneiros e empreendedores. Fonte: tour virtual no site


O segundo exemplo é das comunidades ribeirinhas: na exposição, foram selecionados depoimentos de empreendedores ribeirinhos, que coexistirão com exemplos originais. “Se houve ao fim do século 19 e 20 vários empreendedores que mudaram a cara do Brasil, hoje há vários empreendedores das comunidades ribeirinhas, pessoas que estão fazendo algo semelhante, que merece ser valorizado”. De 6 de junho a 4 de agosto desse ano, a exposição irá a Manaus. As exposições, portanto, promovem a aproximação e o sentimento de identidade dos que a visitam.

Há um livro à parte, feito para professores trabalharem o conteúdo exposto com os alunos, fazendo com que desde cedo a mensagem que se procura transmitir seja comunicada: a de que sempre é possível mudar o entorno para melhor, mesmo nas condições mais adversas. E que talvez um novo Mauá esteja mais perto do que se pensa.

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