ISSN 2359-5191

21/06/2013 - Ano: 46 - Edição Nº: 42 - Arte e Cultura - Instituto de Estudos Brasileiros
As artes têxteis e as questões de gênero
Professora Ana Paula Cavalcanti discute, em artigo, o status da arte têxtil como “inferior” por ser estigmatizada como feminina, usando o exemplo da modernista Regina Graz

Imagem: Foto de Tapeçaria de Regina G. Graz Anos 20. Arquivo Instituto John Graz

 

O movimento modernista rompeu com a tradição acadêmica na história da arte. Entretanto, uma diferenciação que prevalecia quando os trâmites da academia eram a regra, permaneceu quando o modernismo entrou em cena: a com base nos gêneros. A arte em certos suportes continuou estigmatizada. É o caso das artes têxteis (obras feitas em tapeçaria, por exemplo), que mesmo após a Semana de 22 continuou tachada como uma arte feminina, portanto, “menor”. É o que a professora Ana Paula Cavalcanti discute, fazendo um estudo de caso, no seu artigo “Regina Gomide Graz: modernismo, arte têxtil e relações de gênero no Brasil”.

Em sua pesquisa, a professora esclarece que a divisão do fazer artístico tendo com base o gênero vêm de longa data, e a ausência de nomes femininos nas artes consagradas não é uma questão de incapacidade das mulhere, “mas sim a uma prática sucessiva, mais ou menos institucionalizada, de exclusão das mulheres do campo artístico. Dentro do sistema acadêmico, elas enfrentaram um obstáculo bastante concreto: o de não serem aceitas nas academias de belas artes”.

As mulheres, excluídas das academias, passaram a se dedicar a artes “menores”, como os retratos, as aquarelas, e “toda a sorte de artes aplicadas, particularmente as tapeçarias e bordados”. Aos poucos, mulheres e as artes menores passaram a ser associadas, sendo que estas últimas acabaram estigmatizadas como campo de domínio feminino.

Ana Paula sustenta em seu artigo que o caso de Regina Graz e seu marido, John, é representativo da “divisão sexual do trabalho dentro dos círculos modernistas” do país. Ambos se conheceram em Genebra, onde as artes aplicadas “desfrutaram de grande prestígio, ao menos desde finais do século XIX”. Eles voltaram para o Brasil no começo dos anos 20, rapidamente se integrando aos artistas que organizaram a Semana de 22, da qual ambos participaram. Eles começaram a produzir projetos decorativos para a elite paulista, juntos, em 1923. Enquanto John era responsável pela criação de móveis, painés e afrescos, “gêneros mais ‘altos’”, Regina e sua irmã, Beatriz, faziam almofadas e cortinas, “trabalhos percebidos como mais ‘delicados’ … Vale ainda ressaltar que cabia a John a idealização de todaa produção, a parte intelectual do projeto, enquanto Regina encarregava-se do que havia de supostamente mais secundário e desvalorizado na empreitada: a mera execução das tarefas, a manufatura envolvida no processo”. Essa divisão do trabalho fez com que as obras de Regina fossem consideradas sem “grande valor estético”, associadas a “um trabalho mais comercial e menos puro”.

Entretanto, a pesquisadora também mostra que não há indícios de rivalidade entre Regina e John por conta dessa divisão: “pelo contrário, Regina e John parecem ter endossado a imagem  – que tanto agradava aos críticos – de uma dupla em perfeita sintonia”. Ana Paula também mostra que, independente do que teóricos possam ter considerado sobre a qualidade artística da produção de Regina, o seu sucesso rendeu frutos: ela inaugurou um ateliê, e depois, nos anos 1940, uma indústria de tapetes, que levava o seu nome - e não o de seu marido, supostamente responsável por uma arte “superior”.

A pesquisadora conclui seu artigo dizendo: “A atuação de Regina foi decisiva para a implantação de um novo gosto e de um novo estilo, bastante modernos, capazes de alçarem as criações têxteis à condição de gênero artístico autônomo, equivalente aos demais. Se nem sempre o tempo, os críticos e os historiadores da arte foram capazes de reconhecer sua contribuição, tal fato ocorre como conseqüência das próprias categorias com que são tradicionalmente julgadas as produções têxteis, associadas a objetos artesanais e femininos”.


Leia também...
Nesta Edição
Destaques

Educação básica é alvo de livros organizados por pesquisadores uspianos

Pesquisa testa software que melhora habilidades fundamentais para o bom desempenho escolar

Pesquisa avalia influência de supermercados na compra de alimentos ultraprocessados

Edições Anteriores
Agência Universitária de Notícias

ISSN 2359-5191

Universidade de São Paulo
Vice-Reitor: Vahan Agopyan
Escola de Comunicações e Artes
Departamento de Jornalismo e Editoração
Chefe Suplente: Ciro Marcondes Filho
Professores Responsáveis
Repórteres
Alunos do curso de Jornalismo da ECA/USP
Editora de Conteúdo
Web Designer
Contato: aun@usp.br