ISSN 2359-5191

26/06/2013 - Ano: 46 - Edição Nº: 45 - Sociedade - Faculdade de Direito
Pesquisa aponta falhas de lei que proíbe véu islâmico na França

Em sua dissertação de mestrado Desafios ao universalismo do Direito Internacional dos Direitos Humanos: estudo de caso do uso do véu na França, apresentada à Faculdade de Direito da USP, a professora Juliana Santoro Belangero afirma que a lei que proíbe o uso do véu integral na França, promulgada no governo de Nicolas Sarkozy, representa uma forma de exclusão e rejeição ao considerado diferente pela República francesa.

A lei a que a dissertação se refere entrou em vigor em 11 de março de 2011 e proíbe o uso dos véus islâmicos conhecidos como burca (que cobre o corpo todo e é utilizado principalmente no Afeganistão) e niqab (deixa apenas os olhos descobertos e é comum na Arábia Saudita) em espaços públicos. O hiyab (mais usado pelas muçulmanas, que cobre apenas o cabelo) e o chador (obrigatório no Irã, cobre todo o corpo e deixa o rosto de fora) seriam permitidos.

Para a pesquisadora, a presença da população muçulmana – estimada entre 4 e 6 milhões de pessoas – na França representa um desafio à universalidade e a homogeneidade da cidadania francesa e foi nesse contexto que o véu se tornou um símbolo da disputa entre a manutenção da identidade nacional e a vivência da tradição muçulmana. "Para a França, tornou-se uma missão civilizatória; para o grupo muçulmano, motivo para a resistência e manutenção de sua diferença", afirma no texto.  

Uma comissão para estudos sobre o véu islâmico, presidida por André Gerin, foi criada em meio à grave crise econômica e em um momento de baixa popularidade de Sarkozy. A dissertação aponta que, embora o processo de deliberação tenha se apresentado como democrático, a maior parte interessada no assunto foi ignorada: apenas uma mulher adepta ao uso do tipo de véu que seria proibido foi ouvida e sua participação não chegou a ser registrada no documento disponibilizado pela Assembleia Nacional Francesa. "Aliás, se a prática denota, na visão da comissão, um 'arcaísmo cultural', uma 'patologia religiosa' e uma incivilidade, não haveria mesmo razões para ouvi-las [as mulheres muçulmanas]", acrescenta.

De acordo com Juliana, foi difícil para a comissão de Gerin buscar argumentos que justificassem a lei, descrita por ela como "restritiva da liberdade religiosa". A tentativa de se embasar nos três fundamentos da República da França – liberdade, igualdade e fraternidade – falhou porque, segundo apresenta sua dissertação, "uma lei proibitiva não levaria necessariamente nem à proteção da liberdade das mulheres – porque, ao contrário, imporia a elas outra restrição – nem à equiparação entre homens e mulheres e muito menos à inclusão da mulher na sociedade francesa".

O argumento que mais apareceu na mídia para justificar a lei, apesar de prontamente rejeitado pela Assembleia Nacional e mesmo pela Comissão, foi o de que o niqab e a burca poderiam ser usados como "esconderijo" de armas ou bombas para terroristas. A justificativa oficialmente apresentada foi que o véu integral ofendia a opinião pública francesa.

Analisando o caso francês no âmbito do direito internacional, a pesquisadora conclui que a hipótese inicial da dissertação de que o Direito Internacional dos Direitos Humanos (DIDH) contribuiu efetivamente para a criação de um conjunto de parâmetros comuns para a relação entre Estados e indivíduos, mas ainda não produziu perspectivas reais de uma cidadania cosmopolita foi confirmada.

De acordo com ela, o DIDH representou um progresso em se pensar que o Estado tem responsabilidade de proteger direitos cujos sujeitos são todas as pessoas, independentemente de sua nacionalidade, mas ainda não é suficientemente universal a ponto de romper os limites das fronteiras nacionais. Para ela, a questão agora é buscar "novos sentidos e significados para o tempo presente que sejam, de fato, mais sensíveis às mudanças do mundo e às necessidades e proteção efetiva das pessoas".

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