São Paulo (AUN - USP) - O Brasil tem os melhores jogadores de voleibol do mundo. Numa equipe, o papel do levantador é fundamental. Tanto é que se costuma considerar que jogadores desta posição correspondem à metade do time. Portanto, o sucesso do país nos últimos anos tem nos levantadores grande parte de suas conquistas.
“O time que tiver uma Fofão, uma Fernanda Venturini, um Maurício (levantadores de alto nível), já está praticamente garantido nas finais de qualquer campeonato”, afirma Rosemeire de Oliveira, integrante do Grupo de Estudos e Pesquisas em Psicossociologia do Esporte (GEPPSE) que defendeu dissertação de mestrado no último dia 18. No estudo, Rose, como é mais conhecida, pesquisou quais aspectos são vistos como sendo fundamentais para atletas da posição.
Divididos em aspectos físicos, técnicos, táticos e psicológicos, o estudo aferiu qual é a categoria considerada principal. Ganhou o psicológico.
Baseado em entrevistas qualitativas com treinadores e atletas – tanto os da posição estudada quanto os atacantes e líberos –, o trabalho apurou 37 idéias sobre as características necessárias aos levantadores, vistas sob a ótica do grupo entrevistado. No total, 48% das idéias remetiam a aspectos psicológicos, revelando a preponderância da categoria quando se trata desta posição específica numa equipe. “Liderança, espírito de equipe e, principalmente, controle emocional são características imprescindíveis para um levantador”, enumera Rose. “A Fernanda Venturini, por exemplo, é o modelo do controle emocional. Tanto é que o pessoal fala que ela é feita de gelo. Começa o jogo de um jeito e termina da mesma forma, do ponto de vista emocional”.
A sensibilidade para perceber se os atacantes estão num bom dia ou não também é importante para os levantadores, segundo Rose. Assim, deverá passar mais bolas para os jogadores que estiverem seguros e que terão mais facilidade de fechar pontos. A motivação para o estudo partiu de uma citação da professora Cida Santos, da EEFE, na qual se alertava para a falta de novos atletas para a posição de levantadores, especialmente nas equipes femininas do Brasil.
Rose, que trabalha na equipe do São Caetano E. C.(feminino) há quinze anos, resolveu estudar este tema para saber como formar jogadores para esta posição. “Perguntei a técnicos quanto tempo seria necessário para o amadurecimento de um levantador, e a conclusão foi a de que vai de 10 a 12 anos”, diz a estudiosa. O problema é que somente com cerca de 20 anos os técnicos definem quem assumirá a posição. Antes disso, os levantadores escolhidos costumam ser os mais baixos, durante o período de crescimento. Se apenas com 20 anos um jogador passa a treinar especificamente para ser levantador, e o tempo de amadurecimento dura cerca de 10 anos, isto significa que somente com mais ou menos 30 anos será um atleta de alto nível, tendo pouco tempo para desfrutar de seu ápice, já que logo deverá se aposentar.
Preocupada com a situação, Rose propõe, a partir de seu estudo, que logo aos 14 anos os técnicos passem a observar quem são os levantadores, para treiná-los desde então. Assim, alcançarão a maturidade aos 25 anos e servirão por mais tempo a seleção. Nesse sentido, o estudo ajuda a nortear a formação de atletas tão importantes para o sucesso da equipe.
Ao mudar a forma de escolher atletas para as posições, a estatura deixa de ser o fator principal para definir funções na equipe. O São Caetano E. C. tem um excelente exemplo desta alteração de paradigma. Na equipe mirim, com faixa de 12 anos, há uma garota com 1,80m, ou seja, é a maior do time. Mas, ao contrário do que se fazia, ela não é escalada para ser atacante. Suas características indicam que será uma levantadora excepcional. Assim, muitos dos que vão assistir aos jogos do mirim, provavelmente se surpreendem ao ver a mais alta das meninas jogando como levantadora. Desta forma, o São Caetano prepara sua levantadora para alcançar maturidade a tempo de contribuir bastante para as equipes adultas.
Apesar da posição ser fundamental para as vitórias – equipes com melhor distribuição relativa ganham 87% dos jogos no masculino e 82% no feminino –, o conflito entre a vaidade e o altruísmo costuma ser problemático, e contribui para a falta de interesse de atletas para assumirem a posição. “Geralmente, os atacantes são exaltados, sobrepondo o destaque do levantador. Para desempenhar esta função, tem que vencer a vaidade, ter humildade e espírito de equipe”.
As demais características, tais como agilidade, criatividade, inteligência tática e virtuosismo técnico, que se enquadram nos aspectos físico, tático e técnico, são importantes, mas não tão essenciais quanto os aspectos psicológicos. Pelo menos, de acordo com a grande maioria das idéias apresentadas pela amostra.
O estudo também apurou que, entre os melhores levantadores há consciência nítida das virtudes necessárias para a posição, enquanto que outros, com pior desempenho, não têm a mesma consciência. Tal dado aponta a importância da coerência entre discurso e prática.
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