ISSN 2359-5191

24/11/2004 - Ano: 37 - Edição Nº: 20 - Ciência e Tecnologia - Instituto de Pesquisas Energéticas
Superintendente do Ipen nega acusações feitas pela Science
Pesquisador afirma que à AIEA cabe somente “checar a entrada e saída de materiais”

São Paulo (AUN - USP) - Um artigo da revista Science acusa o Brasil de tentar esconder a origem das centrífugas da usina de Resende, no Rio de Janeiro, evitando a inspeção da Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA). Segundo Cláudio Rodrigues, superintendente do Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares (Ipen), autarquia do governo do estado de São Paulo associada à USP e gerenciada pela Comissão Nacional de Energia Nuclear (CNEN), as denúncias feitas pela revista “não correspondem à realidade do desenvolvimento tecnológico feito pelo país nessa área”.

O artigo da Science assinala que a tecnologia utilizada no Brasil foi passada ilegalmente por Karl-Heinz Schaab, ex-funcionário de uma empresa alemã fabricante de centrífugas e acusado de ter vendido os desenhos dos equipamentos para o Iraque. Uma das bases de sustentação da hipótese da Science é o fato de Schaab ter sido preso no Brasil em 1996, depois extraditado para a Alemanha em 99.

Apesar de não ter conhecimento do caso Schaab, Rodrigues traça, para sustentar seu ponto de vista, um breve panorama do desenvolvimento dessa tecnologia no Brasil. “O programa teve início no final dos anos 70, com participação da Marinha, Ipen, USP (principalmente através da Escola Politécnica), IPT [Instituto de Pesquisas Tecnológicas] e várias outras empresas nacionais; e a primeira vez que efetivamente enriquecemos urânio foi em 1982, com uma centrífuga inteiramente construída no Ipen. Tudo desenvolvido com tecnologia nacional”, recorda. Ele diz ainda que, passado este momento, “a pesquisa, ainda mantida em sigilo, se preocupou somente em aperfeiçoar o processo até o ano de 1987, quando o governo Sarney anunciou publicamente que o Brasil dominava a técnica de enriquecimento de urânio por centrifugação”.

Em relação às ogivas, o pesquisador diz que o Brasil nunca focou o enriquecimento de urânio para sua produção. “Fora o objetivo da Marinha, que era a construção de submarinos à propulsão nuclear, a pesquisa era dirigida exclusivamente para o desenvolvimento tecnológico”, defende o superintendente do Ipen, em oposição à acusação do artigo da revista Science, que afirma sobre a existência de um projeto militar secreto de construção da bomba atômica no Brasil. O tal projeto teria sido realizado nos anos 80 e abandonado no governo Collor.

Coincidência

Rodrigues destaca ainda a coincidência da preocupação da AIEA surgir exatamente no momento em que o governo brasileiro decidiu utilizar a tecnologia de enriquecimento de urânio, desenvolvida no país para fins comerciais. O programa de enriquecimento de urânio da usina de Resende, que ainda não entrou em operação, visa produzir urânio enriquecido para alimentar os reatores nucleares Angra I e II, feitos para gerar energia elétrica.

Para ele, a AIEA deveria assegurar a utilização pacífica da energia nuclear, o que não significa que seja necessário observar como todo o processo é feito nas dependências da usina. “Cabe a eles verificar somente a entrada e saída dos materiais. A AIEA pode querer uma inspeção completa, mas o Brasil, como país soberano, pode se recusar a revelar os seus segredos tecnológicos; afinal, tecnologia é riqueza”.

Explicando o que este embate pode significar, Rodrigues exemplifica: “é como querer proibir o Brasil de produzir aço porque dele se fabrica facas e revólveres”.

Irã

O debate ganha força com a decisão do Irã, anunciada ontem, de desativar todas as suas instalações de desenvolvimento tecnológico de enriquecimento de urânio. Segundo artigo publicado pela Survival, revista do Instituto Internacional de Estudos Estratégicos (em Londres), o atraso na obtenção de um acordo com a AIEA poderia pressionar ainda mais o Brasil a seguir o exemplo do país islâmico. Com a suspensão, Teerã cumpre alguns compromissos negociados com França, Inglaterra e Alemanha.

Porém, Cláudio Rodrigues adverte que são casos tecnicamente diferentes. “O programa que o Irã está desenvolvendo hoje já foi feito aqui nos anos 80. Lá, se trata ainda de um programa de desenvolvimento tecnológico; no Brasil, a questão é a produção de urânio enriquecido, para fins comerciais, com uma tecnologia já existente. O Irã sequer tem centrais nucleares”, finaliza o pesquisador.

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