Com a proposta de avaliar o desenvolvimento neurocomportamental e físico da prole de ratas que foram expostas ao “crack” durante o período gestacional, a pós-doutoranda Virgínia Martins Carvalho entra em uma área ainda inexplorada pela literatura acadêmica.
O trabalho, que se iniciou em fevereiro e é supervisionado pela professora Helenice de Souza Spinosa, estuda a “droga de rua”, dado que, segundo estudos anteriores, a droga americana que emprestou o nome ao “crack”, o “crack cocaine”, difere substancialmente da droga consumida no Brasil. Aqui, a aparência dela não é de “crack cocaine”, é de pasta de coca, o que, na América Latina se chama “bazuco”, e que possui uma grande quantidade de solventes orgânicos. “A gente sabe que solvente orgânico é bastante neurotóxico. Então, talvez, todos esses efeitos deletérios que a sociedade tem como percepção do usuário, pode ser que não se tratem apenas do fármaco cocaína, mas desse conjunto de fármaco mais solvente orgânico. Daí a justificativa de se trabalhar com a ‘droga de rua’, com o intuito de tentar mimetizar a realidade do usuário”, explica Virgínia.
Segundo a pesquisadora, o crack constitui, hoje, um problema de saúde pública e o estudo se propõe a “avaliar experimentalmente em ratos para que um dia seja possível se prover informações para se fazerem possíveis intervenções com as crianças, intervenções psicopedagógicas específicas, conhecer esse desenvolvimento, se é igual ao de uma criança que não foi exposta, qual seria a abordagem para tratar o problema, se é que é um problema.”
Mundialmente, a política de drogas é regida por convenções, com destaque para a Convenção Única de 1961, retificada em 1972 e em 1990. O Brasil, como signatário, baseou sua legislação na Convenção que, em um de seus tópicos, trata da permissão da utilização de drogas para finalidades científicas ou médicas. O acesso à droga foi, assim, o primeiro desafio do pós-doutorado, dado que há uma série de condições específicas que devem ser respeitadas para a liberação do narcótico.
Outra dificuldade foi a elaboração de um método que fizesse com que as ratas absorvessem a substância, uma vez que não é possível fazer com que fumem o “crack”. Desse modo, buscou-se um meio de se fazer com que os animais absorvessem a substância por via inalatória de forma passiva através da compressão da fumaça oriunda da queima do “crack” para dentro de uma caixa, onde se encontram as ratas. O método se mostrou satisfatório, resultando em uma concentração alta de cocaína, de aproximadamente 1 micrograma por grama de cérebro.
Os próximos passos da pesquisa serão de análise dos testes de comportamento realizados com as ratas não-prenhes expostas ao narcótico e de cruzamento de ratas para, assim, poder expô-las à droga e dar prosseguimento às análises.