São Paulo (AUN - USP) - Por sua opacidade e dureza, observar a parte interna de um dente não é simples. De maneira que muitos dentistas são levados a realizar testes que, mesmo captando relativamente bem os sintomas de algum problema, costumam falhar. O mais utilizado deles consiste em estimular térmica (quente ou frio) ou eletricamente o dente afetado para o paciente dizer se este dói ou não. São métodos baseados na interpretação do profissional e no grau de sensibilidade que o paciente possui, e que podem induzir o dentista ao erro, fazendo-o retirar, às vezes, uma polpa saudável, ou detectar um problema tardiamente.
Em pesquisa realizada pelo Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares (Ipen) em parceria com a Faculdade de Odontologia da Universidade de São Paulo, foi demonstrado, entre outros resultados, que os métodos atualmente utilizados para a análise da vitalidade da polpa dentária induzem o diagnóstico final a uma significativa porcentagem de erro.
Segundo Gessé Nogueira, responsável pela Divisão de Desenvolvimento de Aplicações de Lasers do Centro de Lasers e Aplicações do Ipen, mesmo no caso de técnicas avançadas de diagnósticos sobre a vitalidade pulpar, como a Fluxometria Laser Doppler (FLD), os testes costumam errar entre 8% e 27% quando a polpa está necrosada, e entre 10% e 32% quando a polpa está saudável.
Outros testes, como a descoloração da coroa (por luz direta e por transluminação) e a radiografia (radioluscência periapical e reabsorção externa da raiz), que são técnicas que não utilizam diretamente a sensibilidade do paciente, dificilmente erram no diagnóstico de um dente saudável. Mas no caso de um dente necrosado, a porcentagem de erro é alta. Pode chegar a 51% dos casos, com a transluminação; cerca de 65%, com a radioluscência periapical e perto de 85% com a reabsorção externa da raiz. “Estes tipos de teste são pouco confiáveis e, geralmente, respondem a estados tardios de necrose”, afirma Nogueira.
Tratamento de números
O foco da pesquisa de Nogueira, financiada pela Fapesp (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo), está em melhorar a acurácia do diagnóstico da vitalidade pulpar através de um tratamento de informação mais eficiente do que o feito atualmente.
A pesquisa tem como ponto de partida os registros de fluxo sangüíneo nos capilares da polpa para associá-los a possíveis anomalias. Após o registro, feito com a Fluxometria Laser Doppler, são produzidos algoritmos que classificam a anomalia de forma automática, através de uma máquina. O processo deixa de ter como base uma interpretação para se tornar algo objetivo e mais confiável. “Após elaborarmos algoritmos mais precisos, temos conseguido em torno de 97% de acurácia na análise de dentes permanentes e 100% na de dentes de leite, o que mostra um avanço sensível”, aponta o pesquisador.
Nogueira frisa que outra vantagem do método desenvolvido é que ele independe da experiência ou treinamento do profissional, já que ele poder ser implementado em programas de computador, o que resultaria em um instrumento automático de diagnóstico.
Em fase de estudos, a pesquisa já rendeu uma tese de doutorado e três dissertações de mestrado. “Estamos gerando conhecimento. No momento, não há contato com empresas para que máquinas que façam o diagnóstico em um laboratório sejam produzidas e comercializadas, até porque se trata ainda de um método relativamente caro. Mas o foco é melhorar a acurácia para que possamos demonstrar que o método é bom e confiável”, completa Gessé, dizendo que há a intenção de implementar os avanços obtidos ao menos na odontopediatria.
Polpa
O dente possui três camadas: externamente, há o esmalte, parte mais mineralizada e dura do corpo humano; no meio, está a dentina, tecido que dá a coloração esbranquiçada ao dente; e, mais internamente, está a polpa, tecido irrigado por capilares sangüíneos. Caso afetada, seja por traumas, por uma pulpite irreversível não tratada por ação de bactérias ou por qualquer evento que cause a interrupção do suprimento sanguíneo na polpa, pode ocorrer uma necrose, fazendo o dente morrer. Isto normalmente traz complicações na saúde da região deste dente e outros vizinhos, inclusive infecções mais graves. O tratamento, nestes casos, é o canal.
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