A cena Black paulistana tem grande influência da cultura, história e política afro-americana. Esse fenômeno é trazido principalmente por meio da música tocada nas baladas black, locais não apenas de diversão ou entretenimento, mas também de conscientização do papel do jovem negro no Brasil. Essas são algumas conclusões de uma pesquisa realizada pela jornalista Daniela Fernanda Gomes da Silva na Escola de Artes, Ciências e Humanidades (EACH) da USP. A dissertação de mestrado “O som da diáspora – A influência da black music norte-americana na cena black paulistana” foi orientada por Mauro de Mello Leonel Junior.
A formação identitária, mais ligada à cultura afro-americana, desses jovens frequentadores de bailes de black music ocorre principalmente por uma ausência de referenciais positivos referentes ao negro no Brasil. A semelhança entre os costumes brasileiros e norte-americanos é vista pela pesquisadora como “um elo entre os povos da diáspora africana, que foram escravizados tanto no Brasil quanto nos Estados Unidos.”
A pesquisa teve início com uma viagem a Atlanta, cidade norte-americana localizada no estado da Georgia. Em Atlanta, Daniela percebeu que os costumes dos jovens negros norte-americanos são muito semelhantes aos costumes dos negros brasileiros que frequentam a cena black paulistana, conhecida por ela. Ela define a black music por alguns ritmos musicais como o soul, original funk, o blues, o rhythm and blues, o hip hop e outros. Essa constatação foi um impulso para a sua pesquisa de tcc na especialização em Mídia, Informação e Cultura do Centro de Estudos Latino-Americanos sobre Cultura e Comunicação (Celacc) da USP e posteriormente motivou o início de sua pesquisa de mestrado, realizada entre 2011 e 2013 no programa de estudos culturais da EACH.
Encontro com as origens
De maneira qualitativa, Daniela analisou entrevistas de 18 jovens envolvidos na cena black. A constatação principal foi a existência de uma influência real da cultura norte-americana na formação identitária deles. A principal razão destacada foi a falta de referenciais positivos na cultura negra brasileira, alvo de preconceitos, racismos e segregação. A pesquisadora identifica nessa semelhança cultural um elo proveniente da origem africana, mantida pelas tradições.
Outro objetivo do estudo foi entender como se dá essa semelhança, como ele acontece e por quais motivos. “Para isso procurei traçar não apenas um panorama histórico desses bailes desde a década de 1970, mas, também, contextualizá-los dentro da realidade brasileira e mundial em cada período”, conta Daniela. “E procurei ir um pouco mais além para mostrar quais eram os fatores históricos da realidade do racismo brasileiro que permitem que uma relação como essa se desenvolva.”
Segundo a pesquisadora, a população afro-brasileira tem pouco contato com suas origens, não sabendo o suficiente sobre a própria história, ancestrais e ícones de sua cultura, devido ao processo histórico vivenciado no Brasil. Esse desconhecimento acaba tornando mais frágeis as reações necessárias para a formação identitária.
Diante disso, o estudo realizado torna-se um importante guia sobre o assunto. “Acredito que meu trabalho pode contribuir muito para a formação identitária do povo negro no Brasil e para um resgate do protagonismo histórico de 51% da população brasileira que ainda se vê acorrentada pelo racismo e deixada em segundo plano”, relata.