Em dissertação de mestrado defendida no Instituto de Biociências (IB) da USP, e orientada pelo professor Paulo Takeo Sano, Rebeca Viana procurou criar associações entre o conhecimento científico e local acerca de duas espécies de plantas – capim-dourado e buriti – nas comunidades da Mumbuca e do Prata no Jalapão, em Tocantins. Essas plantas foram escolhidas pela pesquisadora por que estes povoados, em sua maioria, sobrevivem economicamente do artesanato feito a partir destas espécies.
Com entrevistas que partiam de duas perguntas: “Se você fosse explicar o capim-dourado e o buriti pra alguém que nunca veio no Jalapão, como é que você explicaria essas plantas?” e “ O que você gostaria de perguntar para um pesquisador sobre as plantas?” A pesquisadora concluiu que, além de terem uma relação muito afetiva com as espécies, os artesãos conhecem bastante sobre a biologia delas.
A pesquisa intitulada Diálogos possíveis entre saberes científicos e locais associados ao capim-dourado e ao buriti na região do Jalapão, TO foi uma importante prática em educação ambiental, por ser participativa – em que a população em questão participa da elaboração da prática e o educador se envolve com a história das pessoas. Algumas jovens da região contribuíram para a realização das entrevistas e Rebeca diz: “As minhas perguntas geraram, propositalmente, indagações nas pessoas que estavam sendo entrevistadas, a respeito do capim dourado e do buriti”. A fim de responder as indagações surgidas e verificar informações coletadas com os habitantes das comunidades estudadas, foram criados projetos de pesquisa: “A gente fez um projeto científico sobre a anatomia do buriti, partindo do que eles chamavam de buriti-macho e buriti-fêmea”.
Rebeca teve como viés teórico a existência de diversas formas de conhecer a natureza: “A ciência é uma das maneiras de se conhecer o mundo e a natureza, e existem outras formas, que são as das pessoas que estão lidando, no dia-a-dia, com espécies de plantas, de animais ou com os eventos climáticos”.
Ao partir desta abordagem plural do conhecimento humano, acredita que: “É muito interessante que se crie espaços de diálogo entre essas formas de saber, para conhecermos a natureza de uma forma mais completa”.
Diferenças entre as comunidades
A relação dessas comunidades com as duas espécies de plantas não são iguais. O buriti está bastante presente na vida de todas as pessoas, de ambas as comunidades: “o teto das casas das pessoas muitas vezes é feito de buriti, eles fazem doce, tiram remédio e fazem móveis de buriti”, afirma Rebeca.
"Violinha" e brinquedos feitos de buriti (Fotos: Rebeca Viana)
Na Mumbuca, que é mais antiga que o povoado do Prata, o artesanato com capim dourado é uma tradição, portanto, esta planta tem um valor emocional mais forte. Segundo a pesquisadora, o capim-dourado é considerado uma benção divina para o povoado da Mumbuca, enquanto no Prata o valor da planta é mais comercial, principalmente por ter emancipado as mulheres economicamente.
Ao fim da sua pesquisa, Rebeca propôs uma atividade de encerramento no Jalapão: levou às comunidades lupas e microscópios, preparou lâminas com excertos das plantas – como a haste do capim dourado e a seda do buriti – na frente dos artesãos e mostrou para eles. “Foi um momento de descoberta enorme pra eles, ver a planta que eles trabalham sempre, e conhecem tão bem, dentro de uma outra perspectiva que é a perspectiva do microscópio”, conta.
A pesquisadora também se surpreendeu com o conhecimento da morfologia das plantas que eles expressaram ao identificar, por exemplo, a epiderme do buriti ou a explicação para o fato de o capim-dourado brilhar. Diante disso é possível perceber o quão próximo está o conhecimento popular do científico.