São Paulo (AUN - USP) - Indignada, a recém formada enfermeira Adriana Uehara indaga: "O que essas meninas de 14 anos estão fazendo no leito de uma maternidade? Este não deveria ser o lugar delas". Num espaço de apenas quatro meses, 232 partos de mães entre 14 e 19 anos foram realizados no HU. Ou seja, 22,5% das pacientes atendidas eram adolescentes.
Impressionada com os números, Adriana escolheu como tema de sua monografia para conclusão de curso o perfil sócio-econômico e biológico dessas meninas-mães.
Para o desenrolar da pesquisa, desenvolvida entre maio e agosto de 2000, foram analisados os 232 prontuários e os respectivos relatos da assistência social.
Uma das primeiras conclusões a que Adriana chegou foi que 55,2% das mães-adolescentes tinham entre 18 e 19 anos. Porém, algumas informações surpreenderam a pesquisadora: havia uma adolescente de 19 anos que já estava na quarta gestação, outra de 17 anos que acabara de ter o terceiro bebê e três meninas de 15 anos que tinham ganhado o segundo bebê. "Isto é fruto da falta de planejamento familiar. Não existe um trabalho de prevenção eficiente nos postos de saúde e, em muitos hospitais públicos, não há consultas pós-parto para as adolescentes, que ficam ao léu após o nascimento do bebê".
Quanto aos pais, a maioria, 40,7%, tinha entre 21 e 25 anos. A faixa etária entre 16 e 20 também representou parcela significativa, 37,3%. Do total, 59, 9% casaram-se ou uniram-se consensualmente com as mães de seus filhos.
Adriana também verificou, nos relatórios da assistência social, que 61,3% das adolescentes afirmaram ser donas de casa e apenas 26,5% eram estudantes. Tais dados tornam-se preocupantes quando comparados ao grau de escolaridade dessas meninas: 43,1% não completaram nem o ensino fundamental e 29,6% não terminaram o ensino médio.
Do total de fichas analisadas, em apenas 12,2% havia a indicação de que a paciente trabalhava. As atividades remuneradas mais freqüentes foram as de babá, balconista e empregada doméstica. Portanto, a maioria das mães ainda é dependente financeiramente.
No que tange aos aspectos étnicos, a pesquisa revelou um predomínio de adolescentes de cor branca, 60,8%. Em seguida, ficaram as de cor parda, 31,9%, e, por último, as de cor negra, 7,1%. Para efeito de comparação regional, Adriana pesquisou um estudo realizado, em 1989, em Salvador, com 200 adolescentes grávidas, das quais 67,55% eram pardas, 21,9% eram negras e 10,55% eram brancas.
Desde o início, Adriana já tinha em mente o objetivo final de sua pesquisa: obter dados que a permitissem comprovar a necessidade de uma equipe multidisciplinar especializada em adolescentes para oferecer às pacientes uma assistência individualizada e humanizada. "As meninas-mães são um grupo especial que precisa de ajuda - são crianças em transição para a vida adulta e que já têm a responsabilidade de cuidar de um filho". Além disso, defende a idéia de que o acompanhamento estenda-se ao pai da criança, que, muitas vezes, também é um adolescente diante dos problemas típicos da idade somados ao desafio da paternidade.
As inseguranças e os traumas desses futuros pais e mães poderiam ser trabalhados ainda no pré-natal se houvesse um programa específico para eles em todos os postos de saúde e, principalmente, se todas as meninas fizessem o acompanhamento médico durante a gravidez. Nas pesquisas, a enfermeira observou que 42,9% das jovens realizaram de três a cinco consultas, 39,8% fizeram de seis a oito visitas ao médico, 11,6% foram a nove ou mais consultas e 5,7% não foram ao posto nenhuma vez ou no máximo duas vezes. Segundo o Ministério da Saúde, para a realização de um adequado acompanhamento pré-natal deve-se ter, no mínimo, seis consultas.
Mas, na monografia, a enfermeira alerta que as possíveis complicações da gravidez na adolescência vão além de fatores psicológicos. Ocorre maior incidência de prematuridade entre filhos de mães adolescentes, principalmente menores de 16 anos, devido ao incompleto desenvolvimento do útero, incapaz de aumentar o volume no terceiro trimestre de gestação, e à insuficiência placentária causada pela imatura vascularização uterina. 24,1% dos nascimentos analisados foram de bebês prematuros.
Em suas considerações finais, Adriana apontou uma solução para o crescente número de adolescentes grávidas concomitantemente com a iniciação sexual cada vez mais precoce: "O planejamento familiar é um tema obrigatório a ser abordado com essa clientela pela elaboração e pela implantação de programas educacionais contextualizados no meio sócio-cultural desses jovens, na tentativa de reduzir o problema da gravidez indesejada na adolescência."