São Paulo (AUN - USP) - Com vinte mil cópias baixadas em mais de 1.500 cidades brasileiras e 43 países, o curso on-line de Braille, desenvolvido pela Faculdade de Educação da USP, ensina àqueles que lêem com os olhos a linguagem das pessoas que lêem com as mãos. O Braille virtual é disponibilizado gratuitamente pela internet e pode ser salvo em disquete e usado até mesmo em computadores de poucos recursos.
Por meio de animações gráficas, exercícios e jogos, o software apresenta os 63 símbolos do Braille, formados pela combinação de seis pontos em uma célula. Os símbolos são divididos em grupos de dez para facilitar a memorização. O usuário aprende quais as posições dos pontos que formam cada letra, número e símbolo do Braille. A partir daí, ele poderá ler textos em Braille apenas substituindo as letras comuns pela nova simbologia.
“O curso surgiu para combater a exclusão das pessoas com deficiência visual”, afirma a professora Nely Garcia, criadora do projeto. A docente relata que pais e professores não ajudavam as crianças sem visão em suas tarefas porque desconheciam e não tinham interesse pelo Braille. Hoje, Nely recebe e-mails de pais e escolas agradecendo a oportunidade de aprender e contando casos de crianças que procuram no supermercado embalagens contendo o sistema Braille.
Numa época em que predomina a cultura da imagem, o Braille Virtual assume um papel inclusivo de destaque, estimulando a comunicação entre as pessoas com deficiência visual e as demais. Muitas vezes há uma resistência do próprio cego em aprender o Braille, encarado como um sistema estranho que só uma minoria utiliza. “Ao desmistificar esta linguagem, a aceitação pela própria criança também aumentou”, relata Nely. Outro dado interessante é que até as pessoas com visão muito debilitada já começaram a aprender a nova simbologia. A intenção é facilitar sua comunicação caso venham a perder a visão.
A exclusão das pessoas com deficiência visual também reflete a falta de políticas públicas no setor. Há poucos especialistas em orientação e mobilidade (que ensinam a utilizar desde a bengala até o cão guia) e muitas pessoas, principalmente crianças, necessitam de alguém que as acompanhe. Em pesquisa desenvolvida por Nely há quatro anos, constatou-se que apenas 0,1% das escolas em todo o estado de São Paulo tinham algum tipo de atendimento para crianças deficientes visuais. A exclusão também é sócio-econômica. Segundo o MEC, 70% dos adultos cegos congênitos, principalmente do Norte e Nordeste, são analfabetos.
O site do Braille Virtual também possui animações lúdicas sobre os preconceitos e mitos acerca dos portadores de deficiência visual. Um deles é a genialidade. Úrsula, personagem de Cem Anos de Solidão, de Gabriel García Marques, que quando ficou cega aprendeu a distância exata entre os objetos e conseguiu encontrar uma aliança perdida em meio à bagunça, é apenas ficção. As pessoas com deficiência visual não são gênios. Possuem os mesmos sentidos que qualquer outra pessoa e devem ser tratadas com respeito (o que não significa uma exagerada proteção).
Nely já havia desenvolvido um software parecido há 4 anos, comprado pelo MEC e distribuído para várias escolas. No entanto, o programa era muito grande e só podia ser salvo em CD, o que restringiu sua divulgação. Hoje, mais de vinte instituições do Brasil já adotaram o Braille Virtual para capacitação de pessoal.
Acesse o site do Braille Virtual no endereço: http://www.braillevirtual.fe.usp.br.