São Paulo (AUN - USP) - Foi unânime e contundente a resposta dada pela mesa à questão proposta no tema do debate “O curso de jornalismo deve ser pautado pelo mercado?”. Carlos Costa (Faculdade Cásper Líbero), Heidy Vargas (Universidade Metodista), Carlos Drummond (Facamp), Hamilton Octavio de Souza (PUC-SP) e José Coelho Sobrinho (ECA-USP) responderam quase que em uníssono – não. A discussão, realizada no dia 18 de maio, foi parte da Semana do Jornalismo organizada pelos alunos do curso de jornalismo da Escola de Comunicações e Artes da USP.
O primeiro argumento foi apresentado pelo professor Carlos Costa. Em entrevista publicada em 2004 na revista Diálogos e Debates, o então reitor da Unicamp (Universidade de Campinas), Carlos Henrique de Brito Cruz, afirma que “a Universidade tem uma vocação muito maior” do que formar profissionais qualificados para atender às necessidades do mercado. “A Universidade precisa olhar pelo pára-brisa e não pelo retrovisor. Olhar apenas para o mercado é olhar pelo retrovisor”. As palavras foram ecoadas, de certa forma, por todos os participantes. O papel da Universidade, na visão de Hamilton Octavio de Souza, é criticar e transformar a realidade: “Se formássemos exércitos de mão de obra para as empresas capitalistas, seríamos os maiores criminosos da face da Terra”. Ele citou o movimento pela democratização da comunicação, bandeira empunhada pela Executiva Nacional dos Estudantes de Comunicação Social – “a comunicação é hoje um poder nas mãos da burguesia”, desafia.
Carlos Drummond encontrou a base da questão em uma profunda crise de valores, em que se confundem os interesses públicos (que deveriam ser a única preocupação do jornalista) e privados. “Cada vez mais, a publicidade tenta se infiltrar no conteúdo jornalístico, a ponto de ficar difícil diferenciar notícia de propaganda”, explica. Esse “jornalismo de emboscada” se aproveitaria do interesse do leitor pela notícia, tida como Drummond como vital para a sociedade contemporânea, para vender um produto ou uma imagem. A credibilidade, essencial para o público que consome a informação jornalística (e, segundo Drummond, depende dela), é apenas uma alavanca de lucro para o anunciante. O professor conclui que “as escolas de comunicação não devem se entregar aos interesses do mercado da mesma forma que a vida não deve fazê-lo”.
Um ponto questionado pelos alunos presentes no debate foi a existência, no currículo da ECA, de disciplinas organizadas em parceria com grandes empresas de comunicação, como a Folha de S. Paulo e a Editora Abril, e ministradas por profissionais das mesmas. O professor José Coelho Sobrinho afirma que tais cursos “não eram workshops”, e que havia espaço para debater e questionar a atuação daqueles veículos. “É possível trazer o mercado à escola como elemento de discussão, para que os alunos saibam o que enfrentarão”. A opinião foi apoiada pela professora Heidy Vargas, que considera que, mesmo estando no mercado, o jornalista tem o dever de enxergá-lo de maneira crítica. Ela acredita que é necessário que sejam discutidos os dois lados: “o mercado, pois os alunos vão trabalhar nele, e a discussão crítica, por que é a vocação da Universidade”.
A formação moral do jornalista enquanto cidadão foi o ponto comum das exposições de todos os professores. José Coelho Sobrinho, chefe do Departamento de Jornalismo e Editoração da ECA, acredita que, mais do que a Universidade, a escola de jornalismo tem a obrigação de formar cidadãos. A posição é endossada por Drummond: caberia à escola dar ao futuro jornalista a estatura moral e o aparato técnico para que possa servir à sociedade e atuar no embate entre interesses públicos e privados. Hamilton Octavio de Souza apresentou talvez a opinião mais radical dentre os componentes da mesa: “o mercado deve ser objeto de cursos técnicos como SENAIs ou SENACs – sem desmerecê-los”. A Universidade, defende o professor, deve dar base para que o jornalista “não seja marionete de ninguém”.