ISSN 2359-5191

19/05/2005 - Ano: 38 - Edição Nº: 08 - Sociedade - Escola de Comunicações e Artes
Semana de Jornalismo termina debatendo independência dos veículos

São Paulo (AUN - USP) - A semana de jornalismo da ECA se encerrou na última 6ª feira, 20, com um dos debates mais longos de todo o evento. Com duração de três horas, a discussão acerca da interferência de fatores econômicos e ideológicos no conteúdo dos jornais se tornou em alguns momentos palco de grande controvérsia entre seus participantes.

Os três convidados fizeram breve exposição de 15 minutos aproximadamente e, em seguida, responderam a perguntas do público presente. Reinaldo Azevedo (editor da revista Primeira Leitura) usou um caso recente para explicitar o que seria uma interferência ideológica na prática jornalística: comparou a enorme repercussão do homicídio da missionária norte-americana Dorothy Stang com a quase nula da captura, tortura e assassinato do policial pernambucano Luiz Pereira da Silva pelo MST dias depois. “Isto é manifestação de ideologia”, disse Reinaldo. “Os assassinados que são nossos amigos são mártires; os que são nosso inimigo são ignorados”.

Em relação ao caso, Pablo Ortellado (Centro de Mídia Independente), respondendo a “esta provocação” como ele mesmo disse, afirmou que o problema não é ideológico: “Não tem a ver com direita ou esquerda, e sim com o problema de classes, que é mais uma vergonha nacional”.

Em sua exposição inicial, Ortellado se deteve mais no âmbito econômico. Explorou a influência que anunciantes de veículos teriam sobre a produção de notícias, exercendo até um processo de censura velada no conteúdo jornalístico. Para ele a “missão privada” do jornalismo, que inclui vender seu público para o anunciante, entra em conflito com a missão de informar o público. “Quando um veículo publica uma reportagem em oposição com os interesses do anunciante, suspende-se o anúncio. Quem paga a conta acaba exercendo o poder”. Pablo lembrou que os casos de censura efetiva acabam sendo poucos, afinal “os veículos não precisam pôr a mão no fogo para saber que queima”. O que existiria então seria só uma constante ameaça.

Reinaldo Azevedo discordou: “O governo Collor era o maior anunciante do Brasil e caiu”, disse o editor de Primeira Leitura. “Trabalhei na Folha de 92 a 96, e nunca uma notícia pronta e acabada deixou de sair. Isso não existe, é fantasia”, afirmou Azevedo.

Na mesma linha, esteve o terceiro convidado da noite, Melquíades Cunha Júnior (Agência Estado). “O editor não tem superpoderes. (...) Quem faz a linha editorial dos jornais são os jornalistas”, afirmou. “Jamais sofri pressão para fazer desta forma ou de outra”. No entanto, Cunha Jr. acabou se contradizendo. Falou que o repórter conhece o estilo do jornalismo da empresa em que trabalha e, assim, “não dá murro em ponta de faca porque acabaria sendo sacrificado”. Questionado sobre se a influência ideológica poderia se manifestar no uso de determinados termos em detrimento de outros, Melquíades nega: “não é um problema ideológico da empresa, e sim de competência do corpo de repórteres da redação”.

Melquíades também abordou o lado das finanças. Falou do tipo de jornalismo inaugurado no Brasil por Assis Chateaubriand nos anos 40 e 50, “fazendo da prática uma máquina de ganhar dinheiro, de chantagem”. Assim, citou, sem mencionar nomes, empresas jornalísticas que são um “balcão de negócios”, que “faturam vendendo matérias e que estão aí”.

Bate-boca

Em relação ao caráter hierárquico das empresas jornalísticas, Ortellado disse que o “editor dá a pauta, – e dar a pauta significa dizer que matérias são relevantes e quais não entram – escreve a manchete, o lead e corta o texto”. Isso após um bate-boca com Azevedo que exigiu intervenção do mediador para que o debate se restabelecesse. O desentendimento surgiu após Ortellado dizer que nunca havia trabalhado em uma redação, o que indignou Reinaldo Azevedo.

Após afirmar que Pablo não tinha como conhecer o funcionamento de uma redação, Azevedo disse ser mentira que é o editor quem escreve o lead. Disse, ainda, que “não dá nem tempo pra fazer manipulação ideológica”, contradizendo sua exposição inicial em que apontou a omissão da imprensa – ideologicamente motivada – no caso do assassinato do policial pernambucano. Numa clara alfinetada em Pablo Ortellado, Reinaldo continua: “Tem tempo pra fazer manipulação gente desocupada que não precisa fazer jornalismo pra sobreviver”. Segundo Ortellado, O Centro de Mídia Independente tem custo de manutenção muito baixo por ser uma publicação eletrônica e, desta forma, é mantido por doações.

Leia também...
Nesta Edição
Destaques

Educação básica é alvo de livros organizados por pesquisadores uspianos

Pesquisa testa software que melhora habilidades fundamentais para o bom desempenho escolar

Pesquisa avalia influência de supermercados na compra de alimentos ultraprocessados

Edições Anteriores
Agência Universitária de Notícias

ISSN 2359-5191

Universidade de São Paulo
Vice-Reitor: Vahan Agopyan
Escola de Comunicações e Artes
Departamento de Jornalismo e Editoração
Chefe Suplente: Ciro Marcondes Filho
Professores Responsáveis
Repórteres
Alunos do curso de Jornalismo da ECA/USP
Editora de Conteúdo
Web Designer
Contato: aun@usp.br