Em Rondônia, as chamadas Escolas de Linha representam um diferencial positivo na vida das pessoas moradoras da região. De acordo com a pesquisadora Rosangela Hilario, essas instituições apresentam um acolhimento discente que funciona como motivação para frequentar a escola, além de serem a única representação do Estado.
As linhas são estradas de terra abertas durante a efervescência do extrativismo na e da Floresta Amazônica que perdem sua função após esses períodos, e nas quais se organizam comunidades remanescentes dessas épocas. Portanto, as Escolas de Linha são as instituições localizadas nas linhas que atendem a essas comunidades. Atualmente algumas se tornaram Escolas Polos, ou seja reúnem em um mesmo espaço crianças de diversas Linhas e, até mesmo de fora delas, o que pode significar até vinte quilômetros de distância.
Em sua tese de doutorado A Escola de Linha em Rondônia: a pedagogia da diversidade e acolhimento discente no interior da floresta amazônica, defendida na Faculdade de Educação da USP (FE/USP), Rosangela considerou a ideia freiriana de educação como princípio basilar para a emancipação, e partiu da hipótese de que a escola pode melhorar a vida das pessoas, fazer com que elas tenham o direito de escolha.
A professora estudou uma Escola Polo localizada em um distrito próximo a Ariquemes, uma das principais cidades de Rondônia, analisando documentos produzidos pela escola em suas rotinas - como diários de classe, cadernos dos alunos, bilhetes dos pais - e documentos que orientam e orientaram Políticas Públicas de Educação e Assistência Social, nas décadas de 1970 e 1980.
Rosangela observa que em regiões como o interior de Rondônia, há apenas duas instituições que determinam as regras de convivência: a igreja e a escola. Dessa maneira, as escolas fazem a diferença. Pelo menos nos cinco primeiros anos de escolaridade os diferentes convivem e trocam experiências, “a escola é um diferencial positivo porque baseia seus processos no reconhecimento de que é um microcosmo com culturas próprias e entendimento da função da escola e do conhecimento”, afirma a pesquisadora. De acordo com a professora, o acolhimento se dá em função da união da comunidade para manter a Escola de Linha e às políticas que apoiam a permanência estudantil.
Por outro lado, ainda segundo Rosangela, o reconhecimento da efetividade dessas instituições não diminui as dificuldades relacionadas a ausência do Estado. Quando assumem funções diversas como salão de festas, autoescola, sala do júri, entre outras, desenvolve-se uma política de assistencialismo não como etapa para acolhimento, mas para a perpetuação da pobreza, da miséria e da ignorância.
Outro aspecto negativo é que, como essas escolas estão localizadas em comunidades de pessoas com muita vulnerabilidade econômica, está ocorrendo um processo de polarização, com crianças sendo transferidas para escolas mais distantes. Isso resulta em evasão, aumento da violência e depredação das escolas. Há ainda a discriminação e o preconceito como consequência da interferência da igreja e na falta de continuidade e inconstância da política educacional. Os poucos jovens que se sobressaem vão embora e engordam a estatística do êxodo rural.
Rosangela conclui que as Escolas de Linha representam um diferencial importante para o desenvolvimento de uma proposta que articule acolhimento e compromisso político para emancipação do sujeito. Atualmente ela desenvolve um projeto, financiado pela Pro-Reitoria de Cultura e Extensão da USP, para organizar a memória de escolas de cinco cidades de Rondônia. “Parece pouca coisa, mas representa o reconhecimento da importância destas escolas para o acesso de muitas crianças não apenas na escola, mas no empoderamento de se tornar cidadão.”