A história da gravadora Discos Marcus Pereira foi o tema estudado pelo jornalista José Eduardo Magossi em sua dissertação de mestrado. Ao ver que importantes registros da música brasileira estavam saindo do mercado, Eduardo decidiu escrever sobre a história da gravadora. Mais do que isso, se envolveu também no relançamento de alguns discos da Marcus Pereira.
Criada em 1973 pelo publicitário Marcus Pereira, a gravadora tinha como objetivo registrar o que ele chamava de músicas “culturais”, ou seja, que estavam fora do circuito mais conhecido. Ele e seus colaboradores, como Aluízio Falcão, temiam que a influência do imperialismo americano e os “iêiêiês” de suas músicas acabassem com a cultura brasileira.
Marcus era um dos frequentadores do Jogral, bar muito popular entre os amantes de MPB. Tudo começou quando um dia decidiu gravar Paulo Vanzolini, um dos seus colegas que se apresentava lá, e dar o disco de presente para seus clientes. A experiência deu muito certo e ele repetiu isso diversas vezes até decidir criar a gravadora em si. Com a Marcus Pereira mais estruturada, um de seus primeiros grandes projetos foi fazer uma espécie de mapeamento musical da região do Nordeste. Fizeram um levantamento de todas as manifestações folclóricas do local e gravaram os cantos tanto no lugar de origem com pessoas que os tinham como parte da cultura, quanto em estúdio com artistas mais conhecidos. Com isso, buscavam um equílibrio, de modo a introduzir aquela musica regional desconhecida para um público urbano. Os discos também vinham acompanhados de textos de intelectuais como Ariano Suassuna, constituindo de fato um trabalho de pesquisa sobre a região. O sucesso foi grande e depois se empenharam em gravar outras regiões. Além disso, foi a Marcus Pereira que lançou grandes artistas como Cartola, no qual inicialmente ninguém queria apostar.
Em sua dissertação, Eduardo relaciona a criação da Marcus Pereira com ideias que, na década de 30, Mario de Andrade já perpetuava. Ele tinha a tese de que para um músico ser verdadeiramente nacional ele deveria conhecer a real música brasileira, e para que isso fosse possível era importante que tudo estivesse registrado. Em duas viagens para o Norte e Nordeste, Mario esteve em contato com uma enorme riqueza musical e, temendo que ela se perdesse, registrou a mão as notas musicais de tudo que conseguiu. Dez anos depois, em 1938, criou a Missão de Pesquisas Folclóricas. Essa era formada por pessoas treinadas para ir a campo registrar músicas e festas folclóricas, criando uma espécie de banco de dados dessas expressões culturais. Para Eduardo “Marcus Pereira transformou em disco, um produto de consumo, a tese do Mário de Andrade”.
“Queria fazer uma coisa que não ficasse só na estante da biblioteca”, afirma o jornalista. Pensando nisso, além de produzir uma tese sobre a história da Marcus Pereira, ele decidiu reaviva-la através do relançamento de alguns discos da gravadora. Em parceria com a EMI, realizou um trabalho de recuperar as artes, as letras, remasterizar o som e até incluir textos de contextualização para que os discos ficassem completos como eram os produzidos pela Marcus Pereira. Já foram relançados o disco do Paulo Vanzolini e uma coleção com quatro cds de escolas de samba, outro grande projeto da gravadora. Além disso, agora que o acervo está com a Universal existem planos para 2015.
Eduardo ressalta a importância desse trabalho de recuperação pensando diretamente nas ideias de Mario de Andrade e Marcus Pereira. Afinal, uma das principais conclusões a qual chegou com sua pesquisa é que todo o projeto deles de registrar essas músicas está em risco de se perder. Se os trabalhos não forem cuidados e relançados, todas as canções que se preocuparam em levar ao conhecimento das pessoas, logo não chegarão a ninguém.