São Paulo (AUN - USP) - Levaram seu carro e ninguém viu o delinqüente! “Nunca mais”, pensa o dono do veículo roubado! Resta apenas seguir para a delegacia de polícia e registrar o Boletim de Ocorrências (BO). Nesse caso, o mais provável é ter de se acostumar com o ônibus, pois é pequena a chance de resgatarem o automóvel. Para os pesquisadores da Universidade de São Paulo, o BO é semelhante à patente. Todos fazem o registro, pois são conscientes de que é uma formalidade necessária por garantir muitos direitos e vantagens. No entanto, sabem que os benefícios previstos ao patentearem têm poucas probabilidades de se tornarem reais.
Em palestra ocorrida recentemente no Instituto de Química, o departamento discutiu a importância da patente para a Universidade, além das questões específicas da bioquímica referentes à legislação. Existe a consciência da necessidade de registrar a patente, mas o pesquisador não se sente estimulado a fazê-la por falta de estrutura e perspectivas.
Bárbara Rosemberg é secretária de direitos econômicos no Ministério da Justiça e foi convidada a palestrar sobre a questão para os pós-graduandos e demais interessados presentes. “Antes de tudo, é necessário incentivar o pesquisador garantindo-lhe os direitos intelectuais e o mérito pelo trabalho”, afirma. Ela ainda destaca outros motivos: evitar que diferentes grupos gerem duplicidades pesquisando um assunto já analisado antes, impedir a apropriação do material por terceiros, e garantir o retorno financeiro para todos os recursos investidos.
A função social é também um item previsto pela legislação. Ao mesmo tempo em que o titular da patente ganha o monopólio durante um período determinado, ele tem o dever de realizar a transferência do conhecimento exclusivo através da exploração comercial, gerando riquezas para o País. Caso essa exploração não atenda às necessidades públicas, é possível que haja a quebra da patente. Foi o que alegou o governo brasileiro, recentemente, ao ameaçar os laboratórios americanos Abott, durante negociação de preço e de acessibilidade aos coquetéis importados contra a Aids.
Então, por que deixar de fazer?
Embora os mecanismos legais apontem para muitos benefícios, os pesquisadores da Universidade de São Paulo sentem-se muito desestimulados. Depois de finalizado um trabalho científico, a USP abre uma licitação, em que os interessados pelo trabalho irão “disputá-lo”. No entanto, nem todas as pesquisas concluídas são objeto de interesse do mercado, pois sua utilidade pode ser inviável por questões de demanda, alto custo de investimentos, dificuldade em obter retorno, entre outros motivos. Além disso, não existe um trabalho forte de divulgação das invenções.
A professora do Instituto de Química, Bianca Zingales, conduz pesquisas sobre a Epidemiologia Molecular do Tripanossoma cruzi,e já teve a experiência de fazer uma patente sem que houvesse o retorno esperado. Ela crê na falta de propaganda para ajudar os profissionais. “Não se pode esperar que o pesquisador faça isso (divulgação no mercado). Ele não é um comerciante”.
Hernan Chaimovich, diretor do Instituo de Química, entende o desestímulo dos profissionais. “Eles têm de cantar, tocar, escolher a gravadora e vender o disco”. A dificuldade, segundo Hernan, começa já no planejamento institucional. Em outros países, como os Estados Unidos, há uma preocupação com os fins práticos das pesquisas. Desse modo, enquanto os cientistas estão desenvolvendo seus estudos, a instituição já pensa nas aplicações. No Brasil, isso não acontece e as patentes vão parar nas prateleiras. É um processo demorado. Nesse quadro, existe a consciência quanto à necessidade de se patentear, mas a atitude não passa de uma formalidade.