São Paulo (AUN - USP) - Membros do Instituto Santa Terezinha - organização que trabalha com educação para surdos - se reuniram recentemente com alunos e professores da Faculdade de Educação da USP e a comunidade em geral para compartilhar informações sobre a cultura surda. A palestra, denominada “Identidade e Cultura Surda”, foi ministrada com muito bom humor por Sylvia Lia Grespam Neves, Moryse Vanessa Sanuta e Elomena Barbosa de Almeida. Como as três falavam apenas por linguagem de sinais, a palestra contou com a colaboração de intérpretes.
Sylvia iniciou a palestra falando sobre a significância do termo “cultura” (um conjunto de comportamentos, costumes, hábitos aprendidos de um grupo de pessoas que possuem sua própria língua, valores, regras de comportamento) e em seguida falou sobre a cultura surda. Segundo ela, os surdos possuem uma língua própria, o LIBRAS – Língua Brasileira de Sinais – e, portanto, possuem uma cultura diferenciada. Os surdos desenvolvem arte, teatro, poesia e se organizam em grupos, como de mobilização política, de prática de esportes e grupo de gays surdos.
As palestrantes alertaram que os educadores, quando aprendem o LIBRAS, muitas vezes, não se preocupam em conhecer o mundo do surdo. “Para que a educação seja completa e possa compartilhar valores, quem quer aprender a se comunicar com surdos precisa conviver com eles”, afirma Sylvia. “Ser bicultural, e não somente bilíngüe”, conclui.
Uma diferença marcante entre a cultura surda e a ouvinte é o ato de contar piadas. “Surdos gostam muito de contar piadas”, diz Elomena Barbosa. Ela contou piadas para o público da palestra utilizando o LIBRAS e com a interpretação de Larissa Gotti Pissinatti, auxiliar de coordenação pedagógica do Instituto Santa Terezinha. Em um determinado momento, ela pediu para que não houvesse interpretação e a maior parte do público entendeu do que se tratava a piada. Entretanto, poucos riram. Elomena explicou que isto é comum; o que é engraçado para o surdo, pode não ser para o ouvinte e vice-versa. “São mundos muito diferentes”, afirmou.
As três palestrantes falam das dificuldades que sentem no mundo dos ouvintes, quando vão, por exemplo, ao médico, ao banco, à polícia. Os profissionais destes serviços muitas vezes não entendem o que o surdo quer, o que acaba causando situações de constrangimento. Se comunicar pela escrita não é tão simples para os surdos, porque a estrutura de construção das frases é diferente da língua portuguesa. Segundo Moryse, a sociedade não está preparada para conviver com os surdos. Comumente eles sofrem preconceitos no ambiente de trabalho. Moryse explicou que eles são contratados com base na lei que garante vagas para deficientes físicos, mas, que ao chegar nas empresas, não contam com o auxílio de intérpretes e os surdos acabam perdendo em potencial de produção e desenvolvimento profissional.
A professora Edna Antonia de Mattos, da Faculdade de Educação (FE) e organizadora da palestra, afirma que mesmo a USP ainda está caminhando no que diz respeito a pensar a acessibilidade e inclusão de deficientes físicos na universidade, com iniciativas como o “Programa USP Legal”. De acordo com Edna, a FE também não oferece disciplinas suficientes para atender à demanda da graduação e da pós-graduação sobre o assunto. A idéia de trazer grupos como o do Instituto Santa Terezinha é envolver os alunos da FE e a comunidade em questões como essa, além de promover troca de informações.