Tabloide "Meia Hora de Notícias" traz vocábulos populares típicos da oralidade em sua capa, embora textos das notícias apresentem sintaxe da linguagem escrita
Com tiragem média de 230 mil exemplares, "Meia Hora de Notícias" é um dos jornais impressos mais lidos do país. Imagem: edição de 02/12/2011
"Avião lata velha quase mata Huck, Angélica e filhos", "Marquezine tá no maior love. E não é por Paraisópolis" e "Silvio Santos adora manjar os filmes de sacanagem do Frota" são três manchetes recentemente publicadas na capa do tabloide carioca Meia Hora de Notícias, o sexto jornal mais lido no Brasil. Mas, apesar do tom de piada e do uso de gírias extremamente coloquiais em suas capas, o jornal vem recheado de textos escritos de acordo com a norma culta da língua escrita (embora ainda apareçam oralidades ocasionais). Essa é uma das revelações de um estudo sobre as marcas de oralidade em manchetes do jornal Meia Hora, defendido como dissertação de mestrado por Mayara Suellen de Sousa na Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da USP.
"As marcas de oralidade no texto escrito dos jornais populares servem como estratégia para atrair o leitor, colocando o jornal ao seu lado como um amigo ou conhecido com quem se pode conversar sem grande preocupação com um linguajar rebuscado ou sério demais", explica a pesquisadora. Mayara Suellen de Sousa constatou que a oralidade aparece em 100% das manchetes das 365 capas analisadas. Essas marcas são frequentemente relacionadas ao léxico, como o uso de gírias, sendo algumas de conhecimento popular e outras inteligíveis apenas aos leitores interessados na publicação. "O editor do jornal idealiza um público-alvo que pode ou não se identificar com o discurso, constrói um discurso baseado na imagem que tem do outro", aponta Mayara.
Porém, a pesquisa indica que a linguagem do jornal não pode ser completamente baseada nos recursos da oralidade, já que a fala jamais será totalmente reproduzida em um discurso escrito. Segundo a autora do trabalho, "ao preparar as notícias, o editor se preocupa com a língua culta, com a sintaxe escrita". Por conta disso, ainda de acordo com Mayara Suellen, "ocorre frequentemente um contraste entre a linguagem das manchetes, carregada de recursos da oralidade, e a linguagem das notícias, mais preocupada com a sintaxe da norma culta escrita".
Gírias do público-alvo
A dissertação de mestrado mostra, ainda, que o Meia Hora faz uso de gírias que são de conhecimento geral em boa parte do Brasil, mas também apresenta termos regionais, direcionados ao público-alvo. "Gringo diz que tomou calote do pastor" (edição de 13/05/2013), por exemplo, é uma manchete que se utiliza do termo "gringo", gíria já bastante conhecida para se referir a estrangeiro, e do léxico “calote”, outro termo da linguagem informal muito difundido, que indica dívida não quitada.
Imagem: edição de 13/05/2013
Por outro lado, na manchete "CV chama a polícia no ovo: 'Se brotar no Manguinhos, vai morrer'" (edição de 12/10/2012) encontram-se "termos gírios que podem não ser do conhecimento de leitores que não fazem parte do principal grupo leitor do jornal Meia Hora, o público carioca", como explica Mayara. Observamos o termo “brotar”, com o sentido de aparecer, e a expressão “chamar no ovo”, cujo sentido seria o de intimidar, ameaçar, de acordo com a pesquisadora.
Imagem: edição de 12/10/2012
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