ISSN 2359-5191

18/04/2001 - Ano: 34 - Edição Nº: 04 - Sociedade - Faculdade de Filosofia Letras e Ciências Humanas
Análise diferencia Tocqueville do pensamento neoliberal

São Paulo (AUN - USP) - "Para combater os males que a igualdade pode produzir, só há um remédio eficaz: a liberdade política". Pode-se dizer que a grande paixão de Alexis de Tocqueville era a liberdade. Não é de se surpreender que seu nome atualmente seja constantemente utilizado por defensores do neoliberalismo e da globalização, através de excertos escolhidos a dedo para a exaltação de tais ideais. Erroneamente utilizado, entretanto, já que essas idéias hoje pregadas como modernas e neoliberais estão longe dos ensinamentos do liberal Tocqueville, de acordo com Célia Quirino dos Santos, professora do Departamento de Ciência Política da Universidade de São Paulo.

Seu livro Dos infortúnios da Igualdade ao gozo da Liberdade foi escrito em 1982, mas apenas este ano foi publicado. Nesse tempo, segundo a professora, o interesse por Tocqueville aumentou, não apenas no Brasil, mas no mundo todo. "É um autor cuja obra, embora tenha sido produzida na primeira metade do século XIX, parece adquirir realidade em determinados momentos históricos", lê-se na apresentação. Torna-se excepcionalmente pertinente quando em sociedades sob o comando de governos autoritários, em que o princípio da liberdade mostra-se fundamental para o exercício da cidadania.

O nome do livro, propositadamente impactante, vem a colocar-nos o conflito que Tocqueville apresenta e minucia ao longo de sua obra. A igualdade, que para Quirino chega até a ser confundida com a democracia pelo autor, é considerada por ele um processo constante, imutável, e, sobretudo, providencial. Seu desenvolvimento seria inerente ao desenrolar da história, escapando a todos os homens e a todos os acontecimento.

Os infortúnios causados pela igualização viriam, segundo a professora, principalmente no sentido da massificação, explorada por diversos autores posteriores, e da conseqüente supressão das minorias. "Com a igualização, funda-se uma sociedade não pensante, que não exerce a cidadania", diz Quirino. Tocqueville coloca que esse tipo de sociedade corre um imenso risco de recorrer a uma "tirania da maioria". Majoritariamente nesse sentido é que a igualdade viria a impedir o gozo da liberdade. Nesse contexto, Tocqueville já contesta os neoliberais em sua análise da democracia norte-americana, na medida em que prevê a criação de uma plutocracia nos E.U.A, que poderia levar, segundo ele, a uma ditadura dos ricos.

Lê-se no livro que "tanto a grandeza quanto a felicidade têm uma existência que se confunde com a liberdade, pois só esta permite que se criem condições para que aquelas sejam alcançadas". A obra de Tocqueville, segundo a autora, é um ensinamento em busca da liberdade. Seu principal questionamento seria como conciliar liberdade e igualdade, se uma parece limitar a outra.

A resposta encontrada por ele vem novamente a desmentir os que dele se utilizam em prol do neoliberalismo: a igualdade é que torna os homens independentes, e isso lhes nutre a idéia de liberdade política. "Quando os homens forem perfeitamente livres, é porque serão inteiramente iguais, e quando forem perfeitamente iguais, serão inteiramente livres".

E como se atingir tal estado? Tocqueville dá uma lição que mais parece a nós direcionada: "Instruir a democracia, reanimar seus costumes, regular seus movimentos, substituir pouco a pouco sua inexperiência pelo conhecimento dos negócios (públicos), os seus instintos cegos pela consciência de seus verdadeiros interesses, adaptar o seu governo às condições de tempo e de lugar, modificá-lo conforme as circunstâncias e os homens - tal é o primeiro dos deveres impostos hoje em dia àqueles que dirigem a sociedade".

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