ISSN 2359-5191

17/06/2015 - Ano: 48 - Edição Nº: 51 - Educação - Escola de Comunicações e Artes
Programas paulistas de educação fiscal não desenvolvem consciência cidadã
Segundo pesquisa da USP, essas iniciativas apresentam falhas na educação da população
Programa "Nota Fiscal Paulista" não é considerado educação fiscal, apesar de ser a iniciativa mais conhecida do governo paulista. (Imagem: Shutterstock)

Os programas de educação fiscal do estado de São Paulo não cumprem a tarefa de desenvolver a consciência cidadã. Essa foi a conclusão da pesquisadora Carmem Lúcia Batista em sua tese de doutorado Mediação e apropriação da informação pública: a educação fiscal, defendida na Escola de Comunicações e Artes da USP.

De acordo com a pesquisa, os diversos programas elaborados pelo Estado ao longo dos anos apresentaram, em comum, o discurso de que pagar impostos é importante para que benefícios sociais se tornem possíveis. Para Carmem, essa visão é insuficiente e torna os cursos falhos, pois eles não cumprem a missão de tornar o cidadão consciente de seus direitos e deveres em uma democracia, além de não explicarem como o Estado se organiza e como funciona o complexo sistema tributário do país. "É como se, ao pagar impostos, aumentasse o número de hospitais e escolas, por exemplo. E a gente sabe que entre uma coisa e outra existe um abismo muito grande", diz.

Atualmente, também existem programas de educação fiscal elaborados conforme diretrizes de órgãos internacionais como FMI (Fundo Monetário Internacional), OCDE (Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico) e Banco Mundial, que passaram a ditá-las a partir da crise fiscal dos anos 1970. "Os organismos internacionais perceberam que era preciso frear a corrupção em vários países para aumentar os lucros. Por isso, inseriram o controle de gastos públicos nos programas de educação fiscal", explica a pesquisadora.

Carmem afirma que, por um lado, o mercado desenvolve programas de educação fiscal para que a população controle os gastos do governo. Por outro, o Estado investe nessas iniciativas para diminuir a sonegação do mercado e aumentar a arrecadação. Em nenhum momento existe o objetivo de educar a população, conscientizá-la e tornar a informação pública a respeito da aplicação de recursos mais acessível.

Hoje, o programa mais conhecido no estado é o Nota Fiscal Paulista (NFP), apesar de oficialmente não ser considerada como tal, uma vez que os órgãos internacionais não consideram o uso de sorteios como úteis para fins educacionais. Carmem conta que, observando a NFP, fica claro que as iniciativas do governo não evoluíram. Isso porque o primeiro programa elaborado no estado de São Paulo, chamado de "Talão da Fortuna", também sorteava prêmios àqueles que pediam nota fiscal. O que Carmem questiona, porém, é a validade desse tipo de ação, que não educa e nem deixa o cidadão a par de como reivindicar seus direitos. Outros programas são realizados em ações pontuais, como palestras, bienais e eventos em escolas. De acordo com a pesquisa, eles também são falhos na conscientização do cidadão.

Além de analisar os programas empregados no estado de São Paulo ao longo dos anos, a pesquisadora também fez um estudo prático. Para isso, atuou como tutora no programa de educação a distância Disseminadores da Educação Fiscal (DEF), elaborado pela Secretaria da Fazenda. O programa foi aplicado a educadoras do Programa Educação Cidadã, desenvolvido pela Sociedade Beneficente Israelita Albert Einstein na comunidade Paraisópolis, de São Paulo, que propõe diversas atividades educacionais no local.

No curso, as educadoras puderam estudar novas maneiras de inserir a educação fiscal nas aulas em escolas ou em outras iniciativas educacionais. A pesquisadora notou que, com novas informações sobre o funcionamento do Estado e a presença de um mediador, o programa foi muito mais eficaz, permitindo que os participantes de fato compreendessem um pouco mais do sistema tributário e da importância de apropriar-se da informação pública (como o orçamento do governo) para, a partir disso, fazer reivindicações.

Para Carmem, sua pesquisa mostrou a necessidade de investir em novos programas que sejam mais focados no cidadão, em vez de instrumentalizá-lo com vistas a objetivos próprios. Ela afirma que é preciso criar programas voltados à cidadania, em que a educação fiscal seja apenas uma das temáticas abordadas. "Inserir a educação fiscal assim, do nada, assusta", diz, ao ressaltar a importância de primeiro dar uma base para que, por fim, a tributação possa de fato ser compreendida. “As pessoas às vezes nem sabem por que o Estado existe, por que ele tem que existir. Teria que começar por aí para depois inserir a questão fiscal.”

Paralelamente a isso, a pesquisadora também defende a simplificação das informações públicas, para que o cidadão não somente tenha acesso, mas que compreenda as ações do Estado e a aplicação dos recursos públicos. Como exemplo, Carmem cita o Diário Oficial da União que, segundo ela, tem forma e linguagem muito duras, de difícil compreensão. "A melhor forma de esconder uma informação é colocá-la no Diário Oficial."

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