A tese de doutorado de Cibele Hummel do Amaral, do Instituto de Geociências (IGc/USP), foi a primeira que conseguiu mapear, através do sensoriamento remoto, espécies de árvores indicadoras de ambientes geológicos. A Qualea grandiflora, também conhecida como pau-terra, árvore típica do Cerrado, foi claramente associada nas imagens hiperespectrais ao ambiente de Colinas e Platôs da Geologia Aquidauana, na Estação Ecológica de Mogi Guaçu, interior de São Paulo.
Até então, as pesquisas em geobotânica por sensoriamento remoto tinham trabalhado apenas no nível de comunidade de árvores. Essa ciência estuda a cobertura vegetal como meio de conhecer a formação geológica abaixo dela e teve impulso com a evolução do sensoriamento remoto, nos anos 1970, apoiada em imagens obtidas de satélites. No estudo de Amaral, foi utilizada a tecnologia de imagens hiperespectrais, que conseguem captar centenas de bandas e obter informações detalhadas.
A pesquisadora chegou a incluir 153 variáveis para análise no software Self Organizing Maps, a partir de imagens, cartas topográficas e um extenso levantamento feito na área. A combinação desses dados mostrou que, das 114 espécies arbóreas identificadas em campo, seis delas estavam associadas a três ambientes específicos; duas em cada um deles. Isso permite que se localize as formações geológicas apenas com base na distribuição das árvores.
Uma das espécies, a Qualea grandiflora, evidenciou claramente essa associação quando mapeada em escala de copa nas imagens hiperespectrais, através do método Multiple Endmember Spectral Mixture Analysis (MESMA). A distribuição da árvore era exclusiva ao ambiente de Colinas e Platôs da Geologia Aquidauana, do período Carbonífero. “Essa relação só pode ser dada para essa área, mas já abre uma porta para trabalhos em outras escalas”, explicou a pesquisadora. As demais espécies indicadoras não puderam ser comprovadas nas imagens devido a problemas de processamento. Ainda assim, Amaral considera os resultados muito significativos.
Outro elemento da tese foi a análise bioquímica e espectral das folhas das espécies em diferentes estações do ano, por meio do sensor FieldSpec. A pesquisadora observou que não houve um melhor período para discriminação das espécies indicadoras, o que está associado à alta variabilidade química das folhas. “Por estarem adaptadas ao ambiente que habitam, elas respondem diferentemente às variações do solo e do clima”, explicou.
A pesquisa foi orientada por Teodoro Isnard Ribeiro de Almeida, do IGc, e teve co-orientação de Carlos Roberto de Souza Filho, professor da Unicamp. Seu financiamento foi concedido pela Fapesp (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo).
Tecnologia abre perspectivas
Os resultados da tese foram possíveis graças à natureza hipersespectral das imagens e sua alta resolução espacial, com pixels de 1 metro que permitem visualizar informações de uma única árvore. Foram cedidas imagens pela Fototerra, coletadas a uma altitude aproximada de 1.400 metros pelo sensor aeroportado ProSpecTIR. Para melhor trabalhar com essas tecnologias, Amaral estudou com pesquisadores estrangeiros: durante estágio na Universidade de Califórnia, com Dar A. Roberts, e visita ao CSIRO (Organização de Pesquisa da Comunidade Científica e Industrial), na Austrália, supervisionada por Stephen Fraser.
Segundo a pesquisadora, o mapeamento em alta resolução espacial abre caminho para aplicações em muitos outros campos além da geobotânica, como monitoramento de espécies ameaçadas de extinção e estudos ecológicos com outros elementos condicionantes. “Acredito que futuramente o mapeamento dessas espécies irá nos indicar sobre os fatores que comandam sua distribuição, assim poderemos entender onde elas ocorrem e por que estão associadas a determinados ambientes”, afirmou.