Como a autenticidade de uma marca influencia o comportamento dos consumidores? Buscando responder a essa pergunta, a pesquisadora Márcia Garçon desenvolveu um instrumento capaz de mensurar a autenticidade de marcas e organizações. O trabalho foi realizado em sua tese de doutorado, orientada pelo professor Mitsuru Yanaze, da Escola de Comunicações e Artes da USP (ECA/USP).
Para construir esse instrumento, Márcia precisou primeiro definir o conceito de autenticidade que, segundo ela, é multidimensional. Para isso, ela se utilizou da filosofia, das ciências sociais e das teorias da comunicação para entender como o conceito de autenticidade foi construído ao longo da história. Essa pesquisa deu a ela nove dimensões do que seria autenticidade.
Com as dimensões em mãos, Márcia foi testá-las com doutores em comunicação e marketing e com executivos de comunicação organizacional e publicidade. Ao final desta etapa, a pesquisadora refinou as dimensões, chegando em três que constituem o conceito de autenticidade das marcas: propósito, coerência e tradição.
Coerência mostra se uma marca entrega aquilo que ela promete entregar. “Se uma marca fala que ela é responsável, ela precisa fazer práticas que demonstrem isso”, explica. Propósito diz respeito a valores, missão e identidade da marca. Por fim, a tradição corresponde à origem e história da marca, além de sua manifestação dentro de uma comunidade.
Pesquisa com os consumidores
Para avaliar qual efeito a percepção de autenticidade cria no comportamento do consumidor, a pesquisadora criou um modelo de avaliação com duas outras escalas: de Atitude e de Lealdade. A primeira são crenças que levam o consumidor a ter um comportamento positivo ou negativo diante das marcas, e a segunda mede o quão fiel o consumidor é à marca, ou seja, se ele a recomenda ou recompra seus produtos, por exemplo.
Foram entrevistadas 794 pessoas de 18 a 50 anos de todas as regiões do Brasil. “A partir da explicação dada para os respondentes sobre o que é uma marca autêntica, eles indicaram uma marca que representava aquelas qualidades e responderam todas as questões tendo ela como referência”, disse a pesquisadora.
Coca-Cola foi a marca mais citada como autêntica entre os consumidores entrevistados (Imagem: Reprodução/B9)
O resultado da pesquisa foi que a percepção da autenticidade influencia de forma positiva no comportamento dos públicos estratégicos de uma marca. “Quanto maior a percepção de autenticidade, maior a atitude em relação a essas marcas”, explica. “Essa atitude tem uma relação positiva com lealdade declarada, o boca a boca positivo e a intenção de recompra”.
A pesquisadora ainda pretende aplicar a pesquisa com os demais públicos das organizações, como funcionários, acionistas, fornecedores, distribuidores, entre outros.
A autenticidade das marcas brasileiras
No âmbito internacional, a área é pesquisada desde os anos 2000. “Os pesquisadores internacionais dizem que as mensagens das marcas estão saturadas, isto é, elas estão falando as mesmas coisas”, afirma Márcia. A consequência é que os públicos dessas marcas não encontram diferenças entre elas. Isso gera um comportamento cético, o que influencia negativamente a atitude dos públicos em relação às marcas.
A pesquisadora acredita que, com o instrumento de mensuração e avaliação da percepção da autenticidade, as marcas consigam calibrar melhor as mensagens que precisam emitir ao seu público. “A área de comunicação dentro das organizações tem muita dificuldade para medir o retorno de seu trabalho”, analisa. “Para se colocar como uma área estratégica, ela precisa de elementos de gestão, avaliação e retorno de investimento”.
“Muitas marcas tentam ser autênticas ao inventar uma história que traz a referência de tradição e de valores. Mas, se ela não for verdadeira, em tempos de internet e redes sociais, a sociedade vai descobrir”, adverte. “Para se posicionar como autêntica, uma marca precisa ter coerência, tradição e propósito — ou seja, todas as dimensões devem ser comunicadas e compartilhadas de forma integrada e em todos os pontos de contato com os públicos estratégicos da marca”.