ISSN 2359-5191

17/08/2007 - Ano: 40 - Edição Nº: 35 - Educação - Faculdade de Educação
Tese revela bastidores do conselho fiscalizador de verbas para educação

São Paulo (AUN - USP) - No início desse ano, saiu de cena o FUNDEF - Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério - em ação desde 1998, e passou a funcionar o FUNDEB - Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação, com duração prevista para os próximos 14 anos.

No bojo dessa transposição, uma tese de doutorado defendida este mês na Faculdade de Educação da USP intitulada “Financiamento da educação e gestão democrática: um estudo acerca do Conselho do FUNDEF, no âmbito da União”, traz à tona o funcionamento de uma estrutura que estava estritamente ligada ao FUNDEF, o Conselho de Acompanhamento e Controle Social do FUNDEF, substituído esse ano pelo Conselho do FUNDEB.

O FUNDEF era um fundo contábil, destinado a financiar o ensino fundamental público (1ª. a 8ª. série), constituído por 15% da arrecadação global dos Fundos de Participação dos Estados e do Distrito Federal e dos Municípios, ICMS, IPI e recursos relativos à desoneração de exportações. Um dos principais critérios de redistribuição dos recursos era o número de alunos atendidos em cada rede de ensino. Por isso, uma importante atribuição para o fundo era a do valor mínimo gasto aluno/ano, sobre o qual há legislação específica a ser cumprida: a emenda constitucional 14 de 1996 e a Lei do FUNDEF, no. 9.424 de 1996. Outras diretrizes importantes para a destinação de recursos eram os planos de carreira e remuneração dos professores, pagamento de encargos sociais e investimentos em formação de professores.

A diferença essencial entre o FUNDEF e o FUNDEB é que este último deixa de investir somente no ensino fundamental e passa a investir também na educação infantil, no ensino médio e na educação de jovens e adultos. Para isso a arrecadação dos estados e municípios vai crescer progressivamente para alcançar 20% em 2009, e haverá contribuições da União que, em 2010 deve ser de no mínimo 10% do valor do Fundo, algo em torno de 5,5 bilhões de reais.

No âmbito da União, o Conselho do FUNDEF foi constituído, nos seus 10 anos de existência, por um colegiado com participação de membros do poder público e entidades representativas do setor educacional, possuindo a atribuição de intermediar as relações entre o Estado e a sociedade civil no tangente à administração desses recursos, realizando funções de acompanhamento e controle social sobre a distribuição, a transferência e a aplicação dos recursos do Fundo.

Para realizar a pesquisa, o pedagogo Juca Gil, debruçou-se meticulosamente sobre as 22 atas de reunião do Conselho. Segundo ele, o principal achado da pesquisa é a fragilidade do Conselho como instância de participação da população, pelo seu pequeno número de reuniões e pelo conteúdo de sua ação.

O estudo dedica-se a entender desde a origem do Conselho, seu funcionamento e organização, periodicidade das reuniões e presença dos conselheiros, até aspectos relativos aos conteúdos dos trabalhos empreendidos. Neste último item, o pesquisador desvela as ações e omissões do órgão, os debates e intercâmbios de informações. A pesquisa também tem como referências a legislação e produção científica sobre o assunto, além de outros documentos oficiais. Na terceira parte, investiga as ações de duas estruturas do organograma do Ministério da Educação que atuaram em diversas questões tangentes ao FUNDEF: a “Equipe do FUNDEF” e a Câmara de Educação Básica do Conselho Nacional de Educação.

Gil mostra que o Conselho foi um espaço de intensa troca de informações entre os conselheiros, especialmente entre os governistas, fazendo com que um espaço que deveria ser de intermediação entre governo e população, passasse a tratar de assuntos de articulação do próprio governo sobre o FUNDEF. Em sua participação, os conselheiros de representantes de pais de alunos e trabalhadores da educação foram bastante contundentes, tendo espaço para propor, acusar e denunciar irregularidades quanto ao cumprimento da legislação para o cálculo do gasto aluno/ano por parte do Ministério e do governo federal. No entanto, isso não significou a tomada de medidas em relação ao que era questionado. Além disso, o órgão assumiu funções que não haviam sido legitimamente definidas, como a de formar e informar os conselheiros estaduais através de encontros nacionais, de modo a fortalecê-los.

Para Gil, o controle da gestão e do financiamento de educação não deveriam estar apartados: as principais definições do FUNDEF não eram pauta do Conselho, sendo feitas diretamente pelo Ministério do Planejamento, com base em informações que só eram disponibilizadas após a decisão. As atas mostram que até o Ministério da Educação foi tomado de surpresa em algumas reuniões.

Em sua opinião, o FUNDEF aproximou os educadores do debate sobre o financiamento da educação, mas “O Conselho de articulação com a sociedade civil era engolido pelo poder executivo”, diz. A leitura das atas revela o Ministério do Planejamento chegava às reuniões com as informações prontas e não dava respostas às questões levantadas. Ademais, diferentemente do que ocorria nos Conselhos Estaduais e Municipais, o Conselho da União nunca teve a função de aprovar as contas do FUNDEF. Outro dado alarmante foi a dificuldade do pesquisador de ter acesso aos documentos governamentais. Para poder utilizar as atas em sua pesquisa foi realizada uma requisição formal e assinado um requerimento em que o pesquisador afirmava que não iria usar as atas para outra finalidade que não fosse acadêmica.

Em uma ponta de otimismo, Gil acredita que é possível pensar em uma gestão democrática, caso os usuários dos serviços públicos e a academia entendam que o Estado não está disposto a abrir mão de seu quinhão de poder em prol do poder do povo. “Precisamos deixar de acreditar nele do jeito que está configurado, onde o Conselho fica escutando o executivo mandar e desmandar”, afirma. Segundo ele, Conselho é um avanço, mas ainda é primordial mudar os objetivos, investir em um fluxo de informação eficaz e independente do executivo e em formação para os conselheiros, minando a lógica da falta de informação e formação, que impede os conselheiro de participar com efetividade e tomar decisões.

Nesse momento de transposição, este balanço meticuloso diagnostica problemas e pode, caso haja vontade política, guiar medidas de permitam mudanças. Até o momento, as atribuições do Conselho do FUNDEB são as mesmas do Conselho do FUNDEF, com algumas diferenças: o ingresso de uma entidade representativa dos estudantes, as UBES – União Brasileira dos Estudantes Secundaristas, a proibição do representante do executivo de ocupar o cargo de presidente do Conselho – fato que ocorria no Conselho do FUNDEF, e a proibição da participação de parentes de governistas ou empresas prestadoras de serviços àquele poder público no Conselho.

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