ISSN 2359-5191

17/08/2007 - Ano: 40 - Edição Nº: 35 - Educação - Faculdade de Educação
Educadores indígenas discutem políticas educacionais na FEUSP

São Paulo (AUN - USP) - A perspectiva de que os próprios povos devem ser sujeitos na salvaguarda de seus patrimônios culturais materiais e imateriais, é o que norteia o programa de Formação Intercultural Superior de Professores Indígenas do Estado de São Paulo, que, na semana passada, se apresentou em colóquio na Faculdade de Educação da USP. "Sou da etnia tupi-guarani e estou aqui para representar o meu povo". Desde 2005, a professora Sara Rosário é aluna do Fispi/USP e, na manhã do dia 16 de agosto, apresentou sua experiência como educadora a partir das ferramentas que o programa tem lhe oferecido. Neste primeiro colóquio, o debate entre índios e não-índios mostra uma face mais que pedagógica: eminentemente política.

Os metódos educacionais experimentados pelos professores indígenas participantes consideram e redebatem, tanto na educação infantil quanto no ensino fundamental, as peculiaridades de suas etnias e/ou aldeias. A fala da professora Sara compartilha um destes passos: com a folha do tucum, cada uma das crianças é ensinada a fazer o colar que carrega à casa de reza – tradição que já começava a ser abandonada por conta da chegada da energia elétrica. Muitos já lidam com a interculturalidade dentro de suas aldeias: é o que acontece na aldeia Vanuire, em que a E.E.I. Índia Maria Rosa dispõe de uma sala de aula dividida apenas por uma fina parede para abrigar as etnias Kaingang e Krenak. Para além das dificuldades práticas – que revelam a incipiência das ações estatais –, o intuito é o de formar alunos críticos e ativos dentro das próprias culturas, mas principalmente diante dos códigos da cultura não-índia.

Até a Constituição de 88, o ideário predominante era o de integração destes povos à comunhão nacional, o que implicava em o Estado não-índio ser o responsável por pensar as políticas de educação para a população indígena. O cenário se modificou e a posição dos agentes também. As falas redundam positivamente em um ponto fundamental: a sala de aula perdeu paredes e ganhou o espaço da aldeia inteira. Este curso se insere em um movimento de sistematização destes saberes tanto pelas culturas índias participantes, quanto pela cultura não-índia universitária. Não se trata de simples necessidade de protagonismo, mas essencialmente da tomada para si, por partes destes professores, das rédeas das histórias de seus povos.

No vídeo que abre a série de exposições da tarde de quinta-feira, o antropólogo e professor do programa, Luis Donisete Benzi Grupioni, dialoga com a sala de aula: "Vocês devem se ver os atores políticos discutindo os rumos da educação indígena". A expressão política, contudo, fica clara em muitas mais que as falas institucionais. A troca de experiências logo chega no debate sobre o apoio (por vezes, forte, na maioria, nulo) dado pelas Diretorias de Ensino às comunidades – para o Colóquio, só três representantes delas puderam comparecer. Uma professora tupi-guarani reclama do descaso da Secretaria da Educação com os professores indígenas – ao que parece, no período de atribuição de aulas, o software não os considera: “É difícil ser professor indígena se existe um problema com o sistema”. Os ânimos parecem indicar movimentos de sindicalização.

O professor Ubiratã Gomes, da etnia tupi-guarani, em entrevista, fala da metodologia que costuma levar para a sala de aula/aldeia a partir do que recolhe das aulas que misturam pedagogia tradicional não-índia e troca de experiências práticas: “A gente trabalha com oralidade e temas geradores”. Quando perguntado sobre o trabalho com educação ambiental – uma constante nos programas político pedagógicos não-índios –, o professor se espanta e afirma: “Fazemos roça”. Ele lembra que um dos principais problemas é o da quantidade de adolescentes indígenas ainda matriculados em escolas não-índias, o que agrava a situação de desprendimento da língua e cultura mães. A afirmação é corroborada pela exposição de Potã, que identifica na inexistência de formação para um Ensino Fundamental II indígena o signo de que a assinatura da Convenção 169 da OIT pelo Brasil (que garante educação em todos os níveis para as populações autóctones) não é honrada. Todos estes professores tiveram de passar por Ensino Médio não-índio (ou pelo programa de Magistério Indígena) para hoje freqüentarem a Faculdade de Educação. “Por isso que eu vim aqui lutar e expressar o nosso desejo da continuação deste curso”, termina a professora guarani.

Guarani, kaingang, krenak, terena e tupi-guarani participam do curso com 82 professores-alunos que, há dois anos, se fazem em alicerces para uma educação de padrões interculturais – esforço raramente exigido à sociedade não-índia. O curso desenvolve duas questões recentes, mas advindas de demandas para lá de antigas: o da Educação Escolar Indígena e o da presença indígena nas universidades. Pelo Brasil, universidades como a UFRR e a UFMG também realizam programas atrelados à orientação do documento “Diretrizes para a Política Nacional de Educação Escolar Indígena”, lançado em 1993 pelo MEC. A Lei de Diretrizes e Bases da Educação de 1996 garante a educação bilíngüe – ver http://socioambiental.org/pib/portugues/indenos/polit_educacao.shtm o dossiê feito pelo Instituto SócioAmbiental sobre Educação Escolar Indígena.

Durante os dias 15 e 16 de agosto, a Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo – FEUSP – realizou o Colóquio Formação Intercultural Superior de Professores Indígenas do Estado de São Paulo, no Auditório da Escola de Aplicação. O intuito do Colóquio foi discutir o projeto de mesmo nome, que consiste em um curso superior com duração de três anos, oferecido pela unidade e promovido pelo governo estadual.

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