São Paulo (AUN - USP) - A religião teria origem no medo. Segundo Carlo Ginzburg, é isto que afirmaria o filósofo inglês Thomas Hobbes (1588 – 1679). O historiador e antropólogo italiano veio recentemente ao Brasil por ocasião do lançamento de seu novo livro O fio e os rastros e esteve na Faculdade de Filosofia Letras e Ciências Humanas (FFLCH) ministrando a palestra "Medo, Reverência e Terror: relendo Hobbes hoje".
Para Ginzburg, “o medo está no centro da filosofia de Hobbes”. De acordo com ele, Hobbes acreditava que os homens poderiam ser intimidados pela imaginação, e a partir do momento que temessem o inexplicável, poderiam temer a um Deus que desconhecessem.
No evento promovido pelo Departamento de Teoria Literária e Literatura Comparada da USP, Ginzburg, como ele mesmo afirmou, fez um caminho longo dentro da biografia e da filosofia do inglês Thomas Hobbes até o presente tornar-se objeto de sua análise. Partindo das teorias do filósofo inglês, ele conceituou o medo como fundador da religião e do Estado.
Segundo Hobbes, o homem em estado de natureza vive em guerra contínua. Essa situação só seria desfeita se as pessoas renunciassem alguns de seus direitos em favor da paz. A renúncia seria feita em favor de um contrato social o qual entregaríamos o comando a um governante soberano: o Leviatã. A este homem, ou assembléia de homens, caberia o direito de punir todos aqueles que descumprirem o acordo.
Ginzburg argumenta então que a origem do Estado também está fundamentada no medo. As pessoas temendo pela própria vida cedem sua liberdade em favor da paz, um bem supremo.
Ao aproximar Hobbes da realidade atual, o historiador levanta uma série de questionamentos sobre a apropriação da religião como arma, principalmente em relação ao conflito entre Estados Unidos e Iraque. A operação norte-americana chamava-se “Choque e terror” (Shock and Awe, em inglês), no qual a palavra terror não teria o significado de terror psicológico, mas sim de terror sagrado. O medo imposto pelos Estados Unidos teria um tom de reverência a uma entidade superior.
Ele ainda comentou que o aumento dos efeitos negativos causados pela poluição e a possível “destruição do mundo como conhecemos” implicaria em um pacto social ainda mais profundo que o atual, no qual teríamos de abdicar ainda mais de nossas liberdades, ou seja, um Leviatã ainda mais poderoso nasceria. “Vamos esperar que esse futuro hipotético não se transforme em realidade”, conclui o historiador.