São Paulo (AUN - USP) - A ética na pesquisa em educação foi uma das preocupações da V Semana de Educação, que discutiu a formação docente na USP. Um ponto comum foi a utilização de resoluções de conselhos na área de saúde como base para pensar, especificamente, a ética entre o pesquisador e o pesquisado, questão considerada urgente de ser debatida e de extrema importância.
Para Flávia Schilling, presidente da comissão de pesquisa da Faculdade de Educação da USP (FEUSP), o pesquisador não deve fazer uma análise que não possa mostrar para seu entrevistado, já que uma pesquisa deve servir para contribuir para aquele sujeito ou para aquela sociedade viver melhor. A pesquisadora ressaltou que o Conselho Nacional de Saúde (Conep) define que uma pesquisa com seres humanos somente deve ser realizada se não houver outros meios de se fazer o estudo e que esta é uma reflexão válida também na área educacional. Além disso, o pesquisador deve ter cuidado com variados aspectos de aplicação de um questionário, como por exemplo, o local, a forma de abordagem e o número de questões.
Isabel Leme, presidente da Comissão de Pesquisa do Instituto de Psicologia, também embasou sua participação nos procedimentos éticos da resolução 196/6 do Conep. A resolução visa proteger o participante da pesquisa, garantindo sua integridade física e mental e liberdade, ou seja, que ele possa decidir se quer participar do estudo. O sigilo absoluto, os riscos potenciais presentes no método, a submissão da pesquisa a uma comissão de ética do local fazem parte das preocupações da resolução, que versa também sobre o cuidado com populações mais vulneráveis ou onde o participante esteja sendo obrigado por um “superior” que aceitou a pesquisa.
Na área de saúde é exigida a assinatura de um termo de consentimento pelo pesquisado no qual conste objetivos, procedimentos, riscos, conseqüências possíveis e formas de indenização. Leme afirmou os critérios da resolução são muito complicados de serem executados e deu alguns exemplos. Na pesquisa-participante o procedimento é construído na pesquisa, já em outros casos a assinatura do termo tem causado desconfiança ou pode afetar a própria pesquisa de modo que a comissão do Instituto de Psicologia está discutindo a validade da assinatura do termo ao final da pesquisa. Já em estudos com crianças, no qual os pais assinam a autorização, a pesquisadora salientou que é importante que a criança tenha liberdade de escolher se quer participar.
Para Leme “Ao invés de ficar normatizando e as pessoas se acomodarem nas regras é importante formar alunos e comitês de ética que não sejam só burocratas, mas que examinem princípios. É melhor ensinar princípios do que regras”, disse.
Na opinião de Belmira Bueno, professora da FEUSP, “esse é um terreno interminável. Temos que estar continuamente dispostos a pensar essa questão”. Bueno avaliou, a partir de uma comparação entre o médico, o engenheiro e o professor, que os erros do professor e, portanto, os danos conseqüentes, nem sempre são tão visíveis quando um erro médico ou a queda de uma construção, por isso são mais difíceis de serem comprovados. Ressaltou que muitas vezes a questão da ética na educação é naturalizada, como se por ser professor a pessoa também fosse ética. Para ela, isso não pode ser visto dessa maneira, já que a ética precisa ser sempre discutida, experimentada.
Bueno recordou que esses processos de constituição de comissões de ética não surgem por acaso, eles são provocados por abusos. Afirmou que na área biomédica esse processo começou após a Segunda Guerra Mundial por conta dos absurdos praticados no nazismo. A professora apresentou resoluções biomédicas de diversos períodos históricos e colocou que a questão da redução do tempo para a pesquisa na pós-graduação pode afetar a possibilidade dessa reflexão. “É preciso que o pesquisador não naturalize a ética, esteja atento a isso, que entenda que sua pesquisa não está acima dos direitos das pessoas com quem ele lida”, afirmou no final de sua apresentação.
O professor Júlio Groppa Aquino reiterou a fala de Bueno. “Tem que haver consentimento do nosso parceiro nas nossas relações”, disse. Para ele, a mesa teve a função de lembrar o que deve ser lembrado. “Quer queira quer não essa reflexão é de ontem, sempre foi, a ética deveria ser algo da ordem do silêncio, do acordo tácito, a gente não precisaria falar sobre ela”, pontuou.
A mesa redonda ocorreu na tarde do dia 27 de novembro no Auditório da Escola de Aplicação, como parte das atividades da V Semana de Educação da Faculdade de Educação da USP, que ocorreu nos dias 26, 27 e 28 de novembro de 2007.